18.4.02



No verdadeiro mundo das sombras

Uma das notícias mais deprimentes dos últimos tempos -- que, vamos combinar, não andam sendo propriamente tempos de notícias exultantes -- foi a do fim do no., onde se fazia, além de jornalismo da melhor qualidade, um exercício contínuo de pensamento. Não há como não lamentar o desaparecimento de forma de vida tão inteligente num país que, a cada dia, se supera em baixarias, e em que os heróis da hora são os ninguéms expostos à curiosidade mórbida de um público que a televisão cultiva, cuidadosamente, para a mais completa e insensível imbecilidade.

Sim, eu sei que nós não temos a exclusividade universal da estupidez humana; na verdade, até importamos os piores modelos de fora. Mas em países que se pretendem civilizados há, pelo menos, um equilíbrio de forças, uma margem de escolha. Numa banca de jornais americana, a gente encontra o pior lixo produzido no planeta -- mas encontra também revistas como o New Yorker ou o Atlantic Monthly, escritas por, e para, animais racionais. A Inglaterra tem, sim, os piores jornais do mundo -- mas tem também uma revista como a The Economist, e um teatro que há mais de 500 anos exalta a palavra e a inteligência. Os franceses têm uma televisão ridícula e uma visão do mundo grotesca -- mas dão aos seus escritores o status de popstars. E por aí vai.

A vulgaridade, em alta geral, aparece mais e paga melhor em toda a parte, mas não há como negar que, nos EUA e na Europa, existe uma consciência social em ação que preserva o mínimo de cultura necessário à sobrevivência intelectual da espécie. Ainda há lugares em que, acreditem!, um bom cérebro é mais valorizado do que uma bela bunda; mas todos, infelizmente, ficam muito longe daqui.

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