31.10.10
29.10.10
Emergência geral!
Três cães lindos e dois gatos maravilhosos, todos saudáveis, mansinhos e bem cuidados, vivem uma situação desesperada: a bípede deles precisa entregar o imóvel, vai voltar a morar com a família e não pode levá-los consigo.
Se alguém puder adotá-los, terá ótimos companheiros...
O perfil e as fotos deles estão neste BLOG.
Se alguém puder adotá-los, terá ótimos companheiros...
O perfil e as fotos deles estão neste BLOG.
28.10.10
Conversa vai, conversa vem
-- Você tem certeza mesmo de que não quer falar sobre a campanha? Você só tem essa semana, depois ela acaba, e aí adiós...
-- Tenho. Absoluta. O que antes já estava ruim, agora ficou pior.
-- Também não é assim. Toda campanha política tem pelo menos alguma coisa positiva. O próprio fato de estar sendo realizada, por exemplo.
-- Isso não é argumento! Não gosto nem de pensar na alternativa. O Brasil já ultrapassou esse estágio. Nós somos uma democracia, ou talvez seja o caso de dizer ainda somos uma democracia, apesar de todos os pesares. Uma das coisas que mais detesto nessa atual campanha é, justamente, a sua feição pouco democrática. A presidência é um cargo sério, o presidente de um país é o presidente de todos os brasileiros, mesmo daqueles que não simpatizam com as suas idéias ou com a sua candidata. Quando faz papel de cabo eleitoral ou de líder de gang não se diminui apenas a si, diminui o cargo que ocupa e, consequentemente, diminui a todos nós.
-- Tá, isso todo mundo já disse e já sabe.
-- Não é verdade. Dá uma olhada no Twitter ou no Facebook. A quantidade de gente que acha normalíssimo o comportamento do presidente é de assustar. Também é de assustar a quantidade de gente que até ontem não tinha idéia de quem é a Dilma e que hoje a põe num pedestal, só porque foi ungida pelo “cara”.
-- Pode ser que, com a propaganda política, tenham passado a conhecê-la melhor.
-- Será mesmo? A propaganda política não faz a gente conhecer ninguém melhor. Pelo contrário, faz desconhecer até quem achava que conhecia. Você algum dia imaginou o Serra distribuindo aqueles santinhos dizendo que “Jesus é verdade”?
-- É, aquilo pegou muito mal.
-- Pegou péssimo! Se Jesus é verdade, como fica a verdade dos brasileiros não-cristãos? E, aliás, o que é que um postulante à presidência tem que meter o bedelho nisso? Ele não está disputando a eleição para Papa.
-- É, mas isso também todo mundo sabe.
-- Ah, mas não mesmo! Se todo mundo sabe, como é que os gênios do marketing, esses que estão aí ganhando por uns meses de trabalho mais do que eu e você vamos ganhar juntas a vida inteira, ignoram?
-- Mas a Dilma também anda com mania de falar em Deus e em ir à igreja por qualquer dá cá aquela palha...
-- Estranho menos, porque a Dilma eu não sei quem é. Eu sei quem são os marqueteiros da Dilma, sei como eles pensam e sei como eles mandam ela se comportar, se vestir e se maquiar, mas, sinceramente, não faço a menor idéia de quem seja a Dilma. Tenho minhas dúvidas, aliás, se ela mesma ainda sabe quem é. Ou quem foi.
-- Pois eu, se escrevesse em jornal, falava da eleição numa crônica sim e na outra também.
-- Já não te basta o jornal inteiro batendo nessa tecla? Você não acha que faz parte do processo democrático ter, num mesmo veículo, assunto para todos, mesmo aqueles que não querem saber das eleições? No outro dia mesmo o Joaquim fez uma crônica linda falando sobre o início da primavera. Estava coberto de razão, as campanhas passam e as primaveras ficam.
-- Pois é, agora você disse: as campanhas passam. É isso que eu estava querendo dizer antes, as eleições passam e se você não falar logo sobre isso não vai poder mais falar, porque elas terão passado...
-- Sim, mas felizmente o assunto não é obrigatório. Eu já acreditei em eleição, já curti tanto campanha política que até andava com adesivo no carro.
-- Você nem tem carro.
-- Já tive. Há muitas luas, mas tive.
-- Mudou você ou mudaram as eleições?
-- As duas coisas, provavelmente; mas acho que as eleições mudaram mais. Antes quase todo carro andava com adesivo, as pessoas punham faixa na janela, sacudiam bandeira, usavam camiseta. E não eram esses pobres diabos que ganham uns trocados para ficar parados na esquina. As pessoas acreditavam, de fato, que o resultado das eleições podia mudar alguma coisa.
-- Mas é claro que pode, como não?
-- Estou cada vez mais convencida de que, em Brasília, todos se tornam iguais. E, ultimamente, quando alguma coisa muda de verdade, em geral é para pior. O Congresso sempre foi isso que a gente sabe, mas nunca teve um Tiririca antes. O meu problema com o Tiririca, aliás, não é que ele seja um palhaço. Acho que há palhaços melhores e mais dignos de confiança do que muitos parlamentares. O meu problema com o Tiririca não é a profissão, mas a indigência mental da criatura. E de seus eleitores.
-- Tá, mas essa fase das eleições já passou. Agora é só presidência, outro nível.
-- Outro nível? E o confronto em Campo Grande, aquilo foi coisa de alto nível?
-- Não, aquilo foi baixaria, mas também não foi tão ruim quanto os tucanos disseram, bolinha de papel ou rolo de fita crepe, vai, nada disso é arma letal...
-- Viu só? Até você está caindo nessa! O problema não é o que jogaram; é ter acontecido! Cuspe na cara também não fere, e daí? Pode-se cuspir nos outros só por causa disso? É inaceitável que uma turma saia para fazer a sua festa, a sua passeata, e os adversários venham com tumulto e provocação! Isso é inadmissível num país civilizado. E não adianta dizer que não foi nada, porque até o comércio fechou as portas... Bando de hooligans! Depois vem o Lula mentir em público e falar em militância de paz e amor, e vem o perito falar em “evento bolinha” e “evento rolo de fita”, mas não vi ninguém falar do “evento pedra” que atingiu a repórter da Globo e tirou sangue.
-- Tá bom, tá bom, então esquece as eleições. Domingo elas acabam mesmo.
-- Ufa! Taí o ponto positivo dessa campanha.
(O Globo, Segundo Caderno, 28.10.2010)
27.10.10
Mais um "descuido"
Depois de José Padilha, cujo nome apareceu na lista de intelectuais que apoiam Dilma sem o seu consentimento, agora é a vez de Ruth Rocha.
Ela não só nega que tenha assinado o documento, como mandou carta aberta à Dilma desancando o PT.
Tá lá no Noblat.
Ela não só nega que tenha assinado o documento, como mandou carta aberta à Dilma desancando o PT.
Tá lá no Noblat.
26.10.10
25.10.10
Ensino: falam os mestres
Hoje deixo a palavra com dois leitores que fizeram comentários no blog a respeito da coluna da semana passada. Vocês se lembram, não? Falei basicamente sobre o uso da internet na educação, e fiquei encantada com o depoimento do professor Marcelo Freire e do trabalho que vem fazendo; da mesma forma, é muito alentador o que escreve o José Lima, especialmente a respeito do trabalho desenvolvido por uma professora que usa o Facebook como ferramenta de ensino. É bom perceber que a turma está atenta e sensível aos desafios da vida online:
“Sou professor de História da rede pública do município do Rio, trabalho em duas escolas na Ilha do Governador. Neste 2o semestre iniciei uma atividade com os alunos que procura reformular o sentido de pesquisa que empregávamos até então. Eu já mantinha um perfil no Orkut para comunicação com os alunos e um blog pessoal, que também trata de algumas questões profissionais. A primeira idéia, então, foi provocá-los para identificarem imagens postadas no blog que fossem relacionadas aos assuntos abordados e que estabelecessem a relação com a matéria, enviando um comentário através do blog com indicação de fonte de pesquisa até uma data determinada, quando os comentários seriam liberados e todos poderiam comparar as respostas. A idéia é utilizar a linguagem visual, obrigá-los a pensarem em palavras-chave para desenvolverem a pesquisa e valorizarem a procura de fontes que atendam ao pedido, já que elas precisam ser apresentadas e estabelecemos regras para que não se repitam. Ao final, podem checar as respostas dos colegas e verificarem as diferenças entre elas. Curiosamente, as duas escolas públicas onde trabalho possuem laboratórios de informática relativamente novos, mas que lamentavelmente possuem computadores lentos e filtros de bloqueios para Orkut, You Tube e outros que acabam travando a atividade dos que não tem acesso à internet em casa. Já trabalhamos com releituras renascentistas, a ideologia do Cazuza, alguma coisa do Monty Python, e a resposta tem sido interessante. Espero que tenha colaborado de alguma forma para exemplificar tentativas de romper com o simples corta/cola que se faz desde o tempo da Mirador. (Marcelo Freire)”
“Depois de um longo tempo em coma induzido, a escola finalmente começa a acordar. Há vários grupos de pesquisa em Educação que exploram o papel da criatividade e da imaginação no ensino, incluindo também o ensino superior. Um deles é o The Imaginative Education Research Group (http://www.ierg.net/). É preciso atiçar a imaginação e a criatividade das novas gerações. O mundo pertence àqueles que inovam, que vão além do que é trivial. Uma amiga minha que ensina introdução à teoria literária propôs aos alunos a criação de perfis imaginários no Facebook para as personagens dos livros que serão analisados. Os alunos estão adorando a empreitada. Achei a idéia fantástica e fiquei tentado a escrever o perfil de Madame Bovary para o Facebook. A grande dificuldade em levar as inovações para o grande público esbarra na necessidade de treinamento e requalificação de professores. As escolas públicas no Brasil estão também superlotadas. Fica difícil ser criativo e prover feedback individual quando se trabalha com mais de 45 alunos por classe. De uma forma ou de outra, a escola vai mudar. E eu vejo essa transformação como a coisa mais importante para definir o futuro da raça humana. Há apenas duas coisas realmente importantes na vida. Uma delas é a Educação. E a outra não é tão importante assim. (Jose Lima)”
(O Globo, Revista Digital, 25.10.2010)
24.10.10
Como comemorar um casamento
A família e os amigos prepararam uma surpresa para a noiva; puseram o filminho no You Tube e... já foram assistidos por quase dois milhões de internautas!
Muito, muito simpático.
23.10.10
O Rio tem concerto sim!
Neste domingo, dia 24 de outubro às 11 horas da manhã, a L'Art vai provar a você que o Rio de Janeiro tem Concerto sim.
Um Concerto Barroco superfaturado de qualidade.
Veja a seguir o que reservamos a você, um investimento de alto valor estético, um horário gratuito para encher o seu domingo de alegria e bom humor!!!
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22.10.10
Um show! Aliás, vários...
Aconteceu ontem, no Guggenheim: a festa do You Tube Play, a Bienal de Video Criativo. Mas os filminhos estão lá e a festa também, porque foi, claro, toda youtubada.
Tem material para a gente passar horas na frente do computador... só não sei se isso é uma promessa ou uma ameaça!
É só clicar AQUI.
Vale uma visita!
A pagininha aparentemente simples acima tem surpresas... Cliquem AQUI, e esperem carregar (demora um pouco).
(Obrigada, Néria!)
21.10.10
Atrás de Sir Richard Burton
Logo no primeiro capítulo de “O colecionador de mundos”, livro de Ilija Trojanow de que falei semana passada, uma grande fogueira é armada no jardim de uma vila em Trieste, na Itália. Nela, imediatamente após a morte do marido, uma viúva manda queimar um bonito livro encadernado em couro. Na vida real, Isabel Burton estava cometendo, há exatos 120 anos, um dos grandes crimes literários do seu tempo. Para “proteger a reputação” do marido, o capitão Richard Francis Burton, queimou todos os seus diários íntimos, observações e anotações feitas ao longo de uma das vidas mais interessantes do século 19. O fogo também levou uma nova tradução de “O jardim perfumado”, de Muhammad al-Nafzawi, obra de literatura erótica árabe do século 15 que Burton comparava aos escritos de Aretino e Rabelais.
Essa barbaridade pouco adiantou; apenas aumentou os rumores acerca das reais inclinações sexuais de Burton, e criou enorme antipatia por Isabel. Quanto ao capitão, continua cheio de admiradores. Muitos me mandaram emails, entusiasmados pela possibilidade de reencontrá-lo, agora numa obra de ficção. Não será a primeira vez que isso acontece: do “Aleph” de Borges ao supracitado “Colecionador de mundos”, passando pelo “Mundo perdido”, de Conan Doyle, a Wikipedia cita mais de uma dúzia de obras de ficcionistas que não resistiram ao homem que, se não tivesse existido, teria que ter sido inventado. E não faltou uma boa recomendação do pool de leitores:
“Há um excelente livro policial que gira em torno de Richard Burton – escreveu David Soledade. -- O título é “A promessa do livreiro”, o autor é John Dunning e a editora é a Companhia das Letras.”
Já Henrique Moraes dá o mapa da mina para os angloparlantes interessados nas memórias da famosa viagem à Meca:
“O multitalentoso Richard Burton é um dos grandes personagens vitorianos da História. No site abebooks.co.uk podem ser encontrados exemplares do autobiográfico “A Secret pilgrimage to Mecca and Medina”, onde ele conta com detalhes preciosos essa extraordinária aventura.”
* * *
“A respeito de Sir Richard Francis Burton, esse Indiana Jones do século 19, gostaria de acrescentar que ele andou por aqui também, -- escreveu José Mário B. F. Lima. – “Viveu no Rio durante dois anos, no reinado de D. Pedro II, do qual se gabava ser amigo pessoal, escreveu dois livros sobre a vida e a geografia do império brasileiro (não recordo os títulos, infelizmente!) e visitou os campos de batalha da Guerra do Paraguai como observador (espião?) do império inglês, escrevendo o livro "Cartas dos campos de batalha do Paraguai", publicado aqui pela Bibliex Editora, uma espécie de diário, cartas para um amigo inglês sob pseudônimo, nas quais descreve aspectos sociais, geográficos/geológicos (era um geólogo compulsivo!) e bélicos do conflito e dos povos e cidades nele envolvidos, a saber, brasileiros, argentinos, uruguaios e paraguaios. Suas descrições das cidades do Rio da Prata são minuciosas e críticas, e nos transportam para o clima vigente na América Latina do seu tempo. Ao longo do volume, ele várias vezes se refere às suas aventuras na África e no Oriente Médio, inclusive sua peregrinação à Meca, disfarçado de árabe! Se o personagem de fato a empolgou, recomendo a leitura do livro mencionado acima.”Eu não disse que um livro fora de série puxa um monte de outros? Agora já são mais dois que preciso procurar, “A promessa do livreiro” e essas “Cartas...”! Mesmo sem ter lido o email do José Mário, porém, Marcelo França faz uma correção ao texto:
“Ele foi cônsul britânico em Santos. E é personagem do lindo filme "Montanhas da Lua". E eu tinha uma biografia dele muito boa, mas o nome dela, esqueci...”
Não seja por isso. Há quem lembre, como Assede Paiva:
“Por oportuno, informo que há outro livro sobre o mesmo aventureiro, escrito por Edward Rice, intitulado “Sir Richard Francis Burton”, Companhia das Letras. É ótimo.“
Fui ao site da editora e vi que o livro ainda pode ser encontrado, numa edição de bolso lançada em 2008 com um subtítulo que dá uma boa idéia do biografado: “O agente secreto que fez a peregrinação a Meca, descobriu o Kama Sutra e trouxe As mil e uma noites para o Ocidente”.
E Arthur Mario Vianna lembra os títulos que José Mário B. F. Lima esqueceu:
“Burton esteve no Brasil no século 19 e escreveu dois livros muito interessantes: “Viagem do Rio de Janeiro a Morro Velho” e “Viagem de canoa de Sabará ao oceano Atlântico” (Editora Itatiaia ). Neste último esteve em 1867 com Carlos Mariani, de tradicional família baiana, em Barra do Rio Grande, às margens do Velho Chico.”
Mas tem mais. Vejam o que diz a Heloisa Barbosa:
“Richard F. Burton é personagem muito estudada por nós, pesquisadores em tradução. Foi cônsul britânico em Santos, onde, com a esposa, fez amizade com o casal José de Alencar. Esta tornou-se a primeira tradutora de Iracema para o inglês: “Iraçéma the Honey Lips: A Legend of Brazil” (Bickers & Son, 1886). Na verdade, há dúvidas se o tradutor não foi ele mesmo, tendo ela apenas incentivado a publicação do livro, após a morte dele. Em 1982, descobriu-se uma tradução dele da obra de José Basílio da Gama: “The Uruguay: a historical romance of South America” (University of California Press, 1982).”
E agora vocês me desculpem, mas tenho que dar uma chegadinha rápida numas livrarias online. Volto logo.
20.10.10
19.10.10
18.10.10
Ensino: a internet como aliada
Na quarta-feira fui conversar sobre crônicas e mídias sociais no Quarta às Quatro, promovido há cinco anos pelo Victor Iorio na Biblioteca Nacional. É um evento muito simpático, aberto à população, e geralmente freqüentado por alunos de escola pública que ouvem o papo do dia depois de uma visita guiada por aquele fantástico templo de livros.
Havia, pois, uma turma de alunos de ensino médio, acompanhada de seus professores, além do público avulso de hábito. E havia uns medos sempre manifestados quando se fala em estudante, internet em geral e mídias sociais em particular. O mais freqüente, e mais antigo, é que a internet estaria “desensinando” as regras da escrita aos jovens. Isso já foi preocupação em relação ao MSN, e hoje, pelo visto, migrou para o Twitter, onde a necessidade de mandar o recado em 140 caracteres gera uma profusão de abreviaturas.
Não acho grave. Mais grave do que abreviar palavras ou usar miguxês (que, me parece, já está ficando “antigo”) nas horas vagas, é não aprender a escrever direito na escola. Pode-se escrever mal sem problema, desde que se saiba como escrever bem. A garotada sabe que uma coisa é uma coisa, e outra coisa é outra coisa.
Na verdade, considero o Twitter um grande aliado da boa escrita. A concisão necessária para dizer algo relevante em 140 caracteres não é fácil de alcançar. A partir do momento em que alguém dispõe de espaço tão exíguo para se manifestar, precisa pensar melhor o seu texto, e precisa aprender a separar o que é essência do que é excesso.
Outro medo – este, na verdade, um problema. Pede-se um trabalho a um estudante, ele vai ao Google, dá um corta&cola e prontinho, trabalho feito. Que fazer em relação a isso? Primeira coisa, saber que os paradigmas mudaram, e que o que se fazia antes na biblioteca pública hoje se faz no computador.
Já houve tempo em que os professores pediam pesquisa e os alunos copiavam letra por letra o texto da enciclopédia ou de algum livro didático. É verdade que, talvez, com o ato de copiar, absorvessem uns resíduos culturais que o corta&cola não tem, mas não há mais volta na forma de pesquisar.
Sendo assim, porque não aproveitar a oportunidade e ensinar aos alunos como fazer boas pesquisas na internet? É preciso ensinar que nem sempre o primeiro resultado vale, é necessário que aprendam a comparar várias fontes, é fundamental que desconfiem de qualquer informação que não consigam checar melhor. Tudo isso é aprendizado, e aprendizado muito útil para o seu (deles – e nosso também) tempo.
Como estimular os alunos a escrever? Fazendo-os escrever onde os colegas possam lê-los. Por exemplo, criando um blog da classe para as redações, onde, além das notas dos professores, eles possam contar com os comentários dos colegas. Fazendo blogs temáticos dividos pelos vários interesses da turma – futebol, cinema, balada. Tudo é assunto.
O Facebook também é um bom ponto de encontro, uma espécie de grande blog comunitário onde as crônicas do cotidiano dos amigos se cruzam num espaço virtual. Ele tem sobre os blogues tradicionais a vantagem de reunir mais rapidamente uma massa de leitores, e de permitir que uns tomem conhecimento automático do que outros escreveram.
A internet pode ser uma grande aliada do ensino. O importante é que ninguém tenha medo de novidades, e de experimentar novas receitas. O mundo está mudando mais rápido do que jamais mudou, mas nós somos parte integral dessas mudanças – e a cara que o mundo vai ter depende, e muito, do que vamos fazer dele.
(O Globo, Revista Digital, 18.10.2010)
17.10.10
14.10.10
Inflexibilidade presidencial
Costumo dizer que escrevo de ouvido. Conhecimento de gramática infelizmente não é hereditário, e como não fui boa aluna de português, não tenho idéia (teórica) do que me faz por uma palavra antes da outra, ou do caminho das interjeições e advérbios. As palavras se encaixam no texto da forma que me parece mais fluida e bonita. É claro que ler dia e noite e estar cercada de pessoas que dominam a língua de trás pra frente me ajudou na formulação desses conceitos. Uma das conseqüências diretas de conviver com palavras bem arrumadas é, na medida da sua própria capacidade, arrumar bem as palavras.
Escrevo isso à guisa de disclaimer, aquele aviso legal muito comum nos países de língua inglesa, que informa ao público que não cabe responsabilidade ao autor da página, fabricante do produto, vendedor da mercadoria ou quem quer que seja pela interpretação indevida, uso idiota ou consumo inadequado de seja lá o que for. O meu disclaimer é necessário para que fique estabelecida desde já a minha inadequação como professora, especialista no idioma ou guardiã da sua norma culta. Sou apenas uma pessoa que ama a língua portuguesa e que, por acaso, dela tira o seu sustento, ainda que não a conheça em todas as suas minúcias.
E por que isso? Ora, porque desde que a campanha política começou, estou por aqui com a palavra “presidenta”, que acho feia, aberrante e sexista. Acrescento ao disclaimer lá de cima que esta é uma opinião pessoal, uma birra individual, uma cisma idiossincrática. A palavra existe e está nos dicionários, mas eu – novamente em caráter pessoal – acredito que nem toda palavra boa está nos dicionários, assim como neles estão centenas, talvez até milhares de palavras que, há tempos, já poderiam ter sido eliminadas do vocabulário.
Para mim parece óbvio que palavras terminadas em “e” funcionam perfeitamente bem para ambos os gêneros. Ou agora vamos começar a dizer gerenta, amanta, assistenta, estudanta, adolescenta? Faz algum sentido, isso? Não, não faz; mas, sabe-se lá por que, a igualmente incongruente palavra presidenta encontrou abrigo nas páginas dos pais-dos-burros. Até aqui, porém, estava lá como um daqueles tantos exemplos de curiosidade semântica que encontramos nos dicionários; não me lembro de ter ouvido ninguém chamando a presidente do Chile de presidenta Bachelet, ou as tantas presidentes de empresas de presidentas disso ou daquilo.
A palavra foi reinventada com a candidatura da Dilma, e agora Inês é morta: depois de tanto tempo de propaganda gratuita, depois de tantos debates e, sobretudo, depois do presidente Lula repetir tantas e tantas vezes a palavra presidenta, tudo indica que a palavra presidente só será usada em relação ao gênero masculino. Uma pena, porque para mim, pelo menos, presidenta está no mesmo nível de incongruência e ridículo que presidento.
* * *
Tentei levar o assunto para o Twitter mas não fui bem sucedida. Recebi, de cara, uma Resposta Clássica: “Acho esta questão não apenas irrelevante como escrota”. Discutir com a dialética elegante do PT é difícil.Coisa mais espantosa aconteceu no Facebook, onde uma moça amável e inteligente, escritora premiada ainda por cima, decidiu ditar o que eu devia (podia?) discutir ou não:
“Cora, com todo respeito: a gente está elegendo presidente do Brasil ou presidente da Academia Brasileira de Letras? A Dilma está tentando discutir o que realmente importa para resolver problemas desse país, e comentários como esses seus continuam desviando o foco. Não acrescentam absolutamente nada.”
Sem querer, o meu comentário trivial sobre a palavra que me desagrada deu origem a uma das respostas mais políticas que recebi nos últimos tempos – e uma das mais reveladoras. Perto disso, a Resposta Clássica não foi nada, porque, além de não ser mesmo nada, partiu apenas de um ignorante.
* * *
A língua é coisa tão misteriosa que outra palavra muito em moda nos últimos tempos não me incomoda nada vertida para o feminino. Se parentas da Erenice tivessem aparecido no noticiário, ao invés de apenas parentes, eu teria achado perfeitamente natural. Não como personagens, claro, mas como substantivos comuns.* * *
Querem uma sugestão de livro para vencer os atribulados dias do segundo turno? Anotem: é o melhor da temporada até aqui. Chama-se “O colecionador de mundos” (Companhia das Letras, tradução de Sergio Tellaroli), foi escrito em alemão pelo búlgaro Ilija Trojanow e trata de um personagem inglês, o capitão Richard Francis Burton, que existiu muito bem existido no século XIX. Não é biografia, mas romance baseado em fatos e personagens reais e irreais.Sir Richard Burton foi o típico explorador inglês vitoriano. Soldado, espião e linguista extraordinário, dominava mais de uma dúzia de idiomas; devemos a ele as traduções para o inglês de “As mil e uma noites” e do “Kama sutra”, que revelaram essas obras ao Ocidente. Estudou as religiões orientais a fundo e era tão hábil na arte de se disfarçar que conseguiu fazer o hajj, a peregrinação a Meca, vedada a não-muçulmanos. Mais tarde, foi atrás da nascente do Nilo, numa viagem cercada de perigos e aventuras inimagináveis.
O empolgante livro de Trojanow se apóia nas grandes viagens de Burton, contadas através de pessoas com quem ele teria convivido, para traçar um retrato tão admirável do personagem que, por conta dessa única leitura, acabei mergulhada em quatro outras: duas biografias de Burton, e dois relatos do próprio Trojanow, um da sua peregrinação a Meca (sim, ele também foi), e outro da sua viagem ao Ganges. Um bom livro puxa outro, mas é preciso um livro fora de série para puxar mais quatro.
(O Globo, Segundo Caderno, 14.10.2010)
13.10.10
11.10.10
Swinging London... nos anos 60!
O que sempre me impressiona é como o mundo era mais vazio. (Obrigada, Flavio H.!)
Nokia N8: perfil de campeão
A semana começou em grande estilo para a Nokia, que convocou jornalistas de toda a America Latina para um evento de dois dias em São Paulo para apresentar a sua nova menina dos olhos, o mui aguardado N8. A aposta é alta: desde 2007, quando apresentou o mítico N95 ao mercado, a empresa não lança um celular que cative corações e mentes da tribo completa. Uns modelos tem seus fãs aqui, outros ali, mas falta um Grande Objeto de Desejo no campo finlandês.
Convivi um bocadinho com o N8 durante esses dois dias e, pelo que vi, ele é um forte candidato ao posto. O aparelho é lindo e muito bem acabado (um monobloco de alumínio, que vêm em diferentes cores), tem boa pega (leia-se: não precisa de capa para não escorregar da mão), ótima tela, navegação web rápida e descomplicada e uma quantidade de atrativos considerável.
O GPS, por exemplo, via Ovi Mapas, funciona realmente bem, e tem instruções por voz para motoristas ou pedestres. Basta sair pela rua com headphones, ou espetá-lo ao som do carro, e prontinho, ninguém se perde. De quebra, há conteúdo do Lonely Planet e do Michelin com dicas locais.
Outra característica de impacto: a conexão HDMI com TVs HD. Durante o evento da Nokia, foi exibido um teaser do filme “Tron, the legacy” a partir de um N8 – e a qualidade não ficava nada a dever a uma boa sala de exibição digital. Até porque o aparelho tem, entre as suas cartas na manga, um tremendo som Dolby Digital Plus Surround.
Ele faz ótimos filminhos em alta definição, e tem uma ferramenta simples para a complexa tarefa de editá-los, permitindo misturar imagens em movimento com fotos e outros stills; o som é captado por dois microfones, mas pode-se sobrepor a ele qualquer música que esteja na memória (de 16Gb, expansível a 48Gb através de cartão).
Que mais? Integração com redes sociais muito simples, web TV com, entre outros, Nat Geo incluído, música ilimitada grátis durante seis meses (são sete milhões de músicas na Ovi Música brasileira) e, claro, acesso aos milhares de aplicativos da Ovi Loja.
O Symbian^3 está mais elegante e funcional no arrasta-e-solta, mas não tenho como ter idéia do quanto exatamente mudou antes de usá-lo para valer. Em princípio, acho que a manutenção do Symbiam no N8 é uma faca de dois legumes: de um lado, facilita enormemente a vida dos usuários que já se acostumaram à interface, e aproveita todo o seu rico legado. De outro, pode afastar a leva cada vez maior de fãs do Android. A conferir.
O N8 já seria um aparelho bastante impressionante “só” com essas características. Mas – rufar de tambores, por favor – ele tem a melhor câmera que já vi num celular. São 12 Megapixels (!) incrivelmente bem aproveitados, com um tratamento de imagem excelente e natural, uma lente Carl Zeiss de 28mm, flash Xenon, e o maior sensor da praça. Chega a ser injusto comparar as fotos do N8 com fotos de outros camerafones; elas competem de igual para igual com as de câmeras compactas. Assombroso.
Há algo de que não gostei no aparelho? Para dizer a verdade, há sim. Em primeiro lugar, o fato de ele ser apenas touchscreen, porque sou fã de teclados físicos; em segundo lugar, a bateria embutida que, pelo que andei vendo, requer chave de parafuso para troca. Em compensação, o acesso ao simcard e ao cartão de memória é muito simples.
O preço dessa pequena maravilha está em R$ 1,5 mil na loja online da Nokia, onde já pode ser encomendado. Quando chegar às operadoras, terá certamente um precinho mais camarada.
(O Globo, Revista Digital, 11.10.2010)
10.10.10
9.10.10
8.10.10
O sentido da vida, segundo As Cobras
As crianças que nasceram quando Luis Fernando Veríssimo parou de desenhar “As Cobras”, em 1997, já andam, já falam e já perguntam qual é o sentido da vida. Para quem acompanhava a dupla de répteis mais bem pensantes do planeta desde que estrearam, as Cobras saíram de cena no outro dia, e deixaram imensas saudades. Agora, para consolo dos fãs, chega às livrarias “As Cobras, antologia definitiva”, edição caprichada de quase 200 páginas e 470 tirinhas, que reúne o melhor do serpentário. Mas chegar a esse número não foi fácil, como explica Isa Pessoa, da Editora Objetiva:
-- Em quase 30 anos, Verissimo deve ter desenhado mais de duas mil tiras, já que elas começaram a ser publicadas aos domingos, e depois passaram a ser diárias, ou quase, -- diz ela. -- A Fernanda Verissimo (filha de Luis Fernando) nos ajudou muito, porque conhecia bem o material e chegou a fazer uma primeiríssima tiragem. De qualquer forma, quando as caixas chegaram aqui na editora, tentamos traçar o mapa das cobras. Por onde elas andaram e onde deixaram seus rastros impagáveis? Assim definimos o roteiro, editando o material por blocos, que procuram recriar as fixações da dupla.
As Cobras nasceram na Folha da Manhã, de Porto Alegre, em plena ditadura militar; além de divertir o distinto público, tinham a delicada missão de passar o recado nas entrelinhas. O regime da época, além de achar que a imprensa abusava do direito de informar, não tinha qualquer pudor em eliminar o que lhe parecia manifestação de mídia golpista. Jornalistas e humoristas trabalhavam numa fronteira delicada, a um passo do censor.
Os desenhos tinham melhor sorte do que os textos. O humor gráfico tem uma conotação lúdica, infantil – e
parecia, talvez, menos ameaçador do que o seu irmão escrito. Ou, como observa Veríssimo, também é possível que os censores entendessem ainda menos os desenhos do que os textos. Assim é que a trupe das Cobras conseguiu serpentear livre, leve e solta entre tesouras e teorias conspiratórias. E, por incrível que pareça, conseguiu se manter atual até os dias de hoje.
-- As tiras políticas, ao contrário do que imaginávamos, não envelheceram, -- diz Isa Pessoa. -- Nossa preocupação era manter a piada e não perder o leitor, mas a crítica das cobras se concentra no ato político e seu contexto, como a corrupção, o tormento das eleições, e assim por diante -- portanto, eliminadas as tiras que eventualmente citavam uma campanha ou personagem específico, quase todas se mantêm atuais. Outras obsessões da dupla, como o fim do mundo, Deus, o futebol, o espaço, a praia, foram contempladas em separado -- as cobras emitem opinião sobre tudo, como sabemos, mas seria um desperdício perder algum veneno sobre temas que lhe são mais caros... Assim, a preguiça para o banho frio ou a angústia diante do universo mereceram blocos à parte, como o que abre o livro, "As cobras existencialistas".
Por que cobras? Porque são fáceis de desenhar, “só pescoço”, como diz o autor, que se considera mau desenhista, apesar do sucesso dos seus cartuns e da tirinha Família Brasil, que continua em cartaz até hoje na “Zero Hora” e no “Estadão”, aos domingos. Embora Luis Fernando Veríssimo ache que as primeiras cobras eram horrorosas e muito mal ajambradas, elas viraram xodó dos leitores assim que saíram do ovo.
Em 1977, ganharam uma primeira antologia (As Cobras e outros Bichos, L&PM), mas nem por isso ficaram blasées. A essa altura já tinham ultrapassado as fronteiras do Rio Grande do Sul e eram curtidas no país inteiro, mas continuaram gentis e perplexas, questionando o mundo à sua volta e dividindo o espaço da tirinha, generosamente, com uma galeria de personagens inesquecíveis, como o Queromeu, o corrupião corrupto, Dudu, o alarmista, Sulamita, a pulga lasciva... As Cobras só eram perversas com as minhocas, a quem espezinhavam sem dó nem piedade: ”Sabe qual é a diferença entre uma minhoca e uma serpentina? A serpentina pelo menos é útil uma vez por ano.” Às minhocas, completamente destituídas de amor próprio, só restava suspirar.
As cobras sobreviveram à ditadura, mas não aos 60 anos do Luis Fernando Veríssimo, que achou que não pegava bem um senhor sexagenário a desenhar cobrinhas. Em 2006, por ocasião do lançamento da “Terra Magazine”, elas ressuscitaram brevemente, para alegria dos fãs – mas logo se recolheram novamente ao silêncio, de onde, a julgar pela disposição do autor, não sairão tão cedo.
Uma entrevista com LFV
O Globo -- Quando você parou de fazer as Cobras disse que não pegava bem um senhor sexagenário desenhando cobrinha. Pois agora que é avô, e com certeza faz coisas mais ridículas do que desenhar cobrinha, temos alguma chance de vê-las ressuscitadas?
LFV -- É, avô perde tudo: senso do ridiculo, super-ego... O que a Lucinda pedir eu faço, dentro de certas limitações físicas. Mas Cobras antigas estão saindo semanalmente, às segundas, no Terra Magazine do Bob Fernandes.
O Globo -- Você não sente saudades das Cobras? Não sente nenhum remorso por tê-las abandonado?
LFV - Na verdade, não. Apesar de fáceis de fazer, as Cobras davam trabalho. Muitas vezes quando chegava no fim do dia e eu achava que já tinha feito tudo que precisava fazer, me lembrava: faltam as cobras. Meu objetivo na vida, agora, é ir trabalhando cada vez menos até pegar no sono eterno.
O Globo -- Quanto tempo levava a criação física de uma tirinha?
LFV -- Variava muito. Às vezes eu fazia muitas de uma penada, às vezes era a última coisa do dia. Quando a idéia estava pronta o desenho saía ligeiro. Mas a idéia nem sempre chegava.
O Globo -- De todos os personagens da tirinha, havia algum que fosse o seu favorito, ou que você simplesmente gostasse mais de desenhar?
LFV -- Eu gostava das cobras recém-nascidas, que saiam da casca e iam descobrindo onde tinham vindo parar. Teve uma que já chegou com um habeas-corpus preventivo, por via das dúvidas.
O Globo -- Qual é a sensação que você tem vendo as Cobras reunidas em antologia? Gosta do desenho, das idéias, das lembranças da época?
LFV -- Felizmente, as primeiras cobras, as originais, não foram incluídas na antologia. Eram horrorosas, muito mal desenhadas. Depois foram ficando mais caprichadas, mais redondas. Quem prestar atenção no desenho pode notar como elas foram mudando com o tempo. Mas o desenho nunca deixou de ser elementar. Quanto a saudades da época, tenho saudade de ter 20 anos menos, mas não necessariamente daquele Brasil.
O Globo -- O seu email antigo não era cobras-alguma-coisa? O nome foi escolhido por carinho aos personagens?
LFV -- Olha, eu acho que nem fui eu que escolhi o nome.
O Globo -- Você já disse que desenhar é muito mais conveniente do que escrever, para preencher coluna do jornal. Continua valendo? Alguma possibilidade de um dia a gente abrir O Globo e ver um desenho seu em vez de texto, lá na página de Opinião?
LFV - Ninguém fez isso melhor do que o Millôr, naquele quadrado do JB. Mas acho que ali no Globo não cabe. Ainda mais se você não for um Millôr. Uma das razões para fazer as Cobras era que, na época em que elas nasceram, você podia dizer mais com desenho do que com texto. Desenho tinha aquela conotação de coisa ludica, infantil, e era conveniente para driblar a censura. Não que as cobras fossem grandes contestadoras, mas sempre passavam alguma coisa.
O Globo -- A filosofia das Cobras é a negação ou o resumo do Pensamento Ocidental?
LFV -- Na medida em que o que nos domina é uma grande perplexidade, as Cobras representam, sim, o Pensamento Ocidental. Principalmente diante do Universo infinito, que elas decididamente não aceitam, pelo menos não sem reclamar.
Queromeu, o corrupião corrupto: descarada ave cada vez mais comum na paisagem política brasileira. Queromeu rouba sem qualquer sentimento de vergonha, e é grande defensor dos valores familiares.
Sulamita, a pulga lasciva: Ninguém jamais viu Sulamita. A gente só vê o que ela diz ou o que pensa – e Sulamita só pensa naquilo. Quando pega um vírus, então, é uma loucura.
Shirlei e Flecha: Se Flecha valesse a metade do que acha que vale, seria um leão ou, no mínimo, um dragão de Comodo. Mas é apenas uma lesma. Felizmente tem a companhia de Shirlei, que ajuda a manter o seu ego nas alturas.
Felipe, o sapo romântico: Tudo o que ele precisa é de um beijo para voltar a ser príncipe, mas quem diz que o mulherio cai nessa? Enquanto não aparece ninguém, ele vai comendo umas moscas aqui e ali.
Dudu, o alarmista: Cobra apavorada com tudo, de cabelos permanentemente de pé, Dudu, típico personagem dos anos de chumbo, em que boatos podiam significar coisas sérias, está defasado. Hoje ninguém se assusta com mais nada.
Tia Jibóia: Vive de regime, coitada. Ou deveria viver, mas não resiste à tentação. Coitados dos nutricionistas! E dos bois, das vacas, dos recenseadores e quem mais chegue perto...
(O Globo, Segundo Caderno, 3.10.2010)
(O Globo, Segundo Caderno, 3.10.2010)
Vida boa
Com as minhas queridas amigas Olivia Byington e Monica Figueiredo jantando no Ping Pong, aquele ótimo restaurante em São Paulo.
7.10.10
E la nave va
No domingo passado o Fantástico trouxe matéria instruindo as novas gerações a se prepararem para o futuro. Juntem dinheiro, cuidem das articulações, façam exercício. Concordo com tudo. Fui uma jovem completamente imprevidente, sou uma senhora bastante imprevidente, e às vezes tenho ataques de pânico quando penso no que o futuro me reserva. Mas, a par disso, orgulho-me de ter acumulado uma bela caderneta de poupança emocional.
A caderneta de poupança emocional é assim: na medida das possibilidades, a gente vive o máximo de aventuras e felicidades, e faz o que gosta e o que tem vontade. Conheci muita gente divertida, fui a uma quantidade de espetáculos, mergulhei, viajei sempre que pude. Um dia, quando estiver velhinha e não tiver mais dinheiro e/ou disposição para pular no primeiro avião e ir para um lugar exótico e desconhecido, bastará folhear mentalmente a caderneta de poupança emocional e pescar lá de dentro um acontecimento bom. Isso supondo, naturalmente, que me sobre memória para tanto...
* * *
A caderneta de poupança emocional não é só uma providência que se adota em relação ao futuro. Ela também ajuda muito no presente, e pode ser uma auxiliar poderosa na prevenção de ataques de depressão. No domingo mesmo, aquele em que o Fantástico deu o sacode geral, eu estava de olho na televisão acompanhando o resultado das eleições. Fiquei muito feliz com a votação mais que expressiva da Marina, de quem sou fã assumida, mas cada vez que os comentaristas falavam nos campeões de votos do país, a minha vontade era me enfiar embaixo do sofá, e começar a chorar, de pura vergonha.Mas debaixo do sofá estava frio, em cima do sofá estava quentinho e, além disso, já passei da idade de derramar lágrimas por causa de política. De modo que peguei a minha caderneta de poupança metafórica e fui atrás de uma boa lembrança. Não precisei ir muito longe – há pouco mais de um mês eu estava na península escandinava, aquela parte do mundo onde tiririca não existe nem como mato, e onde todas as necessidades básicas do ser humano já foram resolvidas – exceto, talvez, o tédio absoluto.
Já escrevi sobre a viagem, vocês lembram. Eu estava com Mamãe, que faturou todas as medalhas no Mundial de Natação Masters e, terminado o campeonato, embarcamos num mega navio de cruzeiro pelos fjords da Noruega. Foi a minha primeira experiência com a modalidade e será provavelmente a última, não por culpa do navio, que tinha todos os luxos que se esperam da espécie, mas porque prefiro ficar em terra firme, explorando ruas e cantinhos na paz do senhor, em vez de zarpar correndo para o próximo porto.
O contraste entre a silenciosa paisagem de cartão postal dos fjords e o interior do Costa Atlântica, o navio em que estávamos, não podia ser maior. O navio tem, como eu disse, tudo a que têm direito os navios de cruzeiro -- e, como se isso não bastasse, é dedicado a Fellini. É o over do over multiplicado algumas vezes por si mesmo, numa profusão de texturas, dourados, muranos e madeiras trabalhadas. A primeira impressão de quem vê o hall principal é a de ter caído numa máquina de pinball, de tantas luzes, brilhos e cores. Levei um susto quando vi aquele exagero, mas o Paulinho, que é veterano em cruzeiros, me explicou tudo:
-- Mamãe, -- escreveu ele -- o espiríto da coisa é exatamente esse. Os navios são decorados dessa forma para você se lembrar, o tempo todo, que está em outro mundo. De férias. Longe de casa. Daí, eles te enchem de comida gostosa, te dão uma cama ótima, e a mágica se completa. Já fizemos cinco cruzeiros, cada um em um navio diferente. Cada um mais extravagante que o outro.
Bom. Eu conseguiria me lembrar de que estou longe de casa com metade da decoração do Costa Atlântica, mas depois de uns dias os excessos passam batidos quando a gente passa batida por eles. E, uma vez que se consiga esquecer o décor, a experiência é muito agradável. Os funcionários são prestativos e gentis, a comida é ótima, a cabine é confortável e bem pensada do ponto de vista da arquitetura, as camas são boas e o chuveiro ótimo. E, maravilha das maravilhas, a gente só tem notícias do Brasil se quiser.
* * *
Já vi muitas comparações de navios com cidades flutuantes, mas depois de ter passado uma semana observando a eficiência com que é gerenciado um navio desses, não sei não. Observei que sempre que atracávamos, times de pintores e faxineiros iam cuidar de detalhes aparentemente irrelevantes do lado de fora da embarcação. O casco é pintado permanentemente. Do lado de dentro, o cuidado é, se possível, ainda maior: tudo é polido, encerado e consertado 24 horas por dia. Não há um buraco no chão, uma faixa mal pintada, uma grade enferrujada.Não sei que cidades (e que navios) conhecem as pessoas que comparam uns e outros, mas nunca vi cidade que funcione como um navio. Geiranger, Stavanger, Flam e as outras cidadezinhas em que paramos durante o cruzeiro chegam perto; mas se o Rio, por exemplo, fosse um navio, já teria ido a pique há muitas luas.
* * *
Outro espanto é a competência da tripulação. Todos são extremamente capazes, e trabalham incansavelmente. Os camareiros e faxineiros às vezes até chegam aos empregos por recomendações de primos, amigos ou irmãos que já trabalham no navio mas, uma vez contratados, têm que mostrar serviço, ou, reza a lenda, são desembarcados na primeira ilha deserta com uma garrafinha de água e um facão para construir uma casa (civil?) com folhas de bananeira.Hmmmm. Pensando bem...
5.10.10
Um ótimo restaurante -- e que rende boas fotos!
Fiquei bem contente com o resultado dessa foto, que fiz no Ping Pong com o velho N97 Mini que o Tiziu havia destroçado há uns meses. O aparelhinho voltou do conserto novo em folha e, como se pode ver, a camera não foi afetada.
Mas fiquei mais contente ainda com a comida deste ótimo dim sum paulista, irmão do Ping Pong em que jantei com a minha amiga Silvia em Londres, há coisa de uns dois anos.
Tudo muito saboroso, bem feito, lindamente apresentado. E, como em todo bom chinês, o serviço é rapidinho...
Em tempo: não estou conseguindo subir fotos direto pro blog aqui de São Paulo. #GRRRRR!
4.10.10
Parabéns, Emília!
Dessa vez, eu não me esqueci.
Acordei sabendo que era o aniversário da Emília, a minha neta linda e querida; mas o dia voou entre o Rio e São Paulo, onde estou agora, e só neste momento é que achei uma folguinha para abrir o notebook e deixar o meu recado.
As fotos das stupas do Nepal têm sua razão de ser: são para dar sorte, e para, quem sabe, inspirá-la, quando for mais crescida, a sair pelo mundo buscando lugares cada vez mais divertidos e interessantes.
Como os seus irmãos, Emilia já é uma grande viajante. Espero, de coração, que continue cultivando esse gosto, e que ainda venha a surpreender muito a vó brasileira mandando postais de lugares que a gente mal sabe que estão no mapa.
Muitas felicidades, minha querida bichinha.
A gente quase não se vê, mas o amor é o de sempre.
iPhone 4: charmoso e tentador
Quando saiu o primeiro iPhone, fiquei muito impressionada com o look do aparelho. Ele era, de fato, um dos celulares mais bonitos que eu já tinha visto. Achei interessante a filosofia do touch screen e a interface linda, mas nada além disso. O aparelho não me ganhou – qualquer smartphone da época fazia mais e melhor.
Ele me serviu como mini tablet de acesso à internet durante uns tempos, e hoje vive conectado a uma caixa Bose fazendo o papel de som da sala. Os dois seguintes, o 3G e o 3GS, foram máquinas mais robustas, mas continuaram, para mim, no papel secundário de aparelhinhos web. Motivos principais: prefiro teclados físicos, gosto de multitasking e preciso de uma boa câmera no celular.
Pois o novo iPhone 4, que uso há uma semana, começa a ganhar espaço no meu coração. É verdade que não tem teclado físico, e que o seu multitasking – a capacidade de realizar diferentes tarefas ao mesmo tempo – é meio seletivo, mas a câmera é ótima (e faz fotos em HDR!), o processador é rápido e a tela é a melhor que já vi, ponto.
No começo estranhei o novo desenho, mas hoje acho até mais funcional (se não mais bonito) que o anterior – escorrega menos.
Gostei muito da possibilidade de arrumar os ícones por pastas, e da “inteligência” com que ele automaticamente nomeia as pastas; e gostei mais ainda que permita ao usuário mudar os nomes tão inteligentemente encontrados. O player é ótimo, como sempre, e a qualidade do telefone, como tal, me pareceu melhor.
A famosa questão da antena, que tanta celeuma causou na época do seu lançamento, é real. Dependendo de como se segura o celular, o sinal diminui e, em alguns casos, vai embora de todo. No começo achei que fosse problema da Vivo; depois, para tirar a dúvida, comprei uma capa – e o problema acabou. Esbarramos, portanto, numa falha séria, e no paradoxo que é ter um lindo objeto de design que precisa, necessariamente, ser coberto com uma capa. Francamente.
Ainda tenho algumas restrições ao iPhone para adotá-lo como aparelho único. Acho que faz muita falta um botão físico para a câmera; o disparador via touchscreen é uma solução meia-sola que mais atrapalha do que resolve, sobretudo quando se quer segurar o aparelho com firmeza.
Outra falha séria: a dependência do iTunes que, cá entre nós, é uma bomba. Não dá para admitir que um aparelho sofisticado como o iPhone 4 não possa funcionar como um simples apendice USB, como faz qualquer xingling de dez real.
A falta do Flash também é complicada, e significa que a gente não consegue ver uma quantidade de coisas na web, assim como a falta do DivX, que torna quase todos os meus filminhos inúteis no iPhone. Faltam também atalhos rápidos para ligar e desligar o Bluetooth, o wi-fi e o 3G. Há aplicativos que realizam essas funções, mas não tem graça gastar uma pequena fortuna no estado da arte da telefonia móvel e ter que sair pelas quebradas procurando apps que resolvam coisas que em smartphones mais antigos já foram resolvidas a contento há muito tempo.
Vale a pena comprar o iPhone 4? Para os fãs do iPhone, essa é uma pergunta ociosa. Vale, com certeza: com todas as suas falhas, ele é bem melhor do que o seu antecessor. Para quem quer celular para se divertir, vale também. Para quem precisa pensar em produtividade e trabalho sério, porém, o melhor ainda é ir a uma loja e dar uma boa comparada entre os muitos smartphones à venda. Não custa lembrar que você e seu celular vão conviver, intensamente, durante um bom tempo.
(O Globo, Revista Digital, 4.10.2010)
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