30.3.10

Um poema de Alberto Caieiro

O Tejo from Abilio Vieira on Vimeo.


Passeio de bicicleta na margem norte do Tejo ao som de "Cais", do projeto "Os Poetas". Por Nuno Trindade Lopes. Editado por Abilio Vieira. E recomendado pela Luísa Cortesão, minha amiga querida.

O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,
Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia.

O Tejo tem grandes navios
E navega nele ainda,
Para aqueles que vêem em tudo o que lá não está,
A memória das naus.
O Tejo desce de Espanha
E o Tejo entra no mar em Portugal.
Toda a gente sabe isso.
Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia
E para onde ele vai
E donde ele vem.
E por isso porque pertence a menos gente,
É mais livre e maior o rio da minha aldeia.

Pelo Tejo vai-se para o Mundo.
Para além do Tejo há a América
E a fortuna daqueles que a encontram.
Ninguém nunca pensou no que há para além
Do rio da minha aldeia.

O rio da minha aldeia não faz pensar em nada.
Quem está ao pé dele está só ao pé dele.

29.3.10

Mamãe em ação

 

Minha amiga Cristina Prochaska estava assistindo a um campeonato de masters nesse fim-de-semana, quando viu uma velhinha das arábias nadando feito um peixe.

Ficou tão impressionada que fez um monte de fotos.

Depois, foi se informar quem era aquela sereia vintage. Achou o nome parecido com o meu, e me feicibucou perguntando se, por acaso, eu tinha algum parentesco com uma certa nadadora masters...

De modo que aí estão as fotos da Cristina.

Provando, mais uma vez, que eu fui trocada na maternidade.
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Tiziu

 
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28.3.10

27.3.10

Um bipinho 0km

 

Este bonequinho tranquilamente adormecido (estava na maternidade: eles disfarçam muito bem!) é o bebezinho do Richard e da Fernanda Lacombe, o Richard John.

Mais um para a turminha dos Tatuís...

Parabéns, Fernanda querida!

O seu filhote é muito, muito bonitinho...
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Olha eles aí... :-)

 
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26.3.10

Emergência felina (ao contrário)

Gente gateira de São Paulo, please: minha amiga Barbara Gancia precisa de um gatinho branco, macho, filhotinho. Vai ter casa, comida, roupa lavada e tudo do bom e do melhor.

Alguém tem um disponível?

Meus gringuinhos foram conhecer Roma

O hobby das contas

ou: Quem tem padrinho não morre pagão






Venho fuçando a internet atrás de contas desde dezembro, mas agora é que começam a chegar as primeiras encomendas -- e a conta-gotas: dia sim dia não, um ou dois tímidos envelopes metem o focinho por baixo da porta, com meia dúzia de continhas cada um.

Para vocês avaliarem melhor a morosidade do serviço e o meu grau de impaciência, esclareço que já encomendei (segurem-se!) pra lá de 650 contas, que só Deus sabe quando chegarão.

Essa coisa das centenas é meio inevitável num mundo que trabalha com pencas, resmas, atacado. Você vai comprar miçangas, o milheiro custa 3 dólares.

Ainda não me acostumei com isso.

Como assim, milheiro?!

Mandei vir praticamente todo tipo de conta em forma de gato que encontrei. A minha idéia é, em cada colar ou pulseirinha, por uma única delas como uma espécie de assinatura. Aí, se as peças ficarem boas, vou escrever uma pequena história daquele específico gato e da coleção de continhas que o acompanha.

Mas isso, claro, ainda demora, porque entre o correio trazer as contas e eu aprender como se faz...

* * *

Independentemente de qualquer coisa, já estou no lucro da felicidade, empolgada com a força dada pelos amigos.

A Francesca Romana Diana, que mexe com isso desde criancinha (sou testemunha, eu a conheci em Roma, adolescente) e hoje tem praticamente um império de bijus, já me abriu as portas da oficina e quer me ensinar tudo.

E o Vik Muniz, que vai domingo pra Nova York, me disse que lá tem uma loja imeeeeeensa de contas (claro, onde mais?) e que ele passa horas lá dentro, fascinado. Apesar disso, nunca comprou nada e se sente meio culpado, mas agora vai comprar continhas pra mim e vai perder o sentimento de culpa.

Não é máximo?

Agora, eu pergunto: com continhas compradas pelo Vik e o auxílio luxuoso da Francesca, tem como não se divertir?

Em tempo: essa conta, e a de ontem, estão entre as minhas favoritas de colares que, por incrível que pareça, considero bastante simples. São lindas, né?

Paris 26 Gigapixels



Dizem que é a maior imagem jamais feita: Paris 26 Gigapixels é uma colagem de 2.346 fotos, compondo uma panorâmica em alta resolução que é, pura e simplesmente, um espetáculo!

Passei horas percorrendo tudo, tentando reconhecer os cantinhos conhecidos, curtindo cada telhado.

Aliás, Paris tem mesmo a terceira fachada mais linda do mundo.

Divirtam-se!

25.3.10

Fazendo as contas




A fatura veio assim: “Cinco redondas com estampa de oncinha, cinco compridas com estampa de girafa, cinco irregulares com estampa de zebra, dez de vidro azuis e douradas, seis com estampa de tigre, três art-nouveau grandes com desenho de pavão, seis micro gatos de porcelana dourada, dois peixes vintage em cloisonné.” Num bilhete anexo, a vendedora sugeria que eu desse uma olhada nos pingentes novos, feitos de um material furta-cor que muda conforme a refração da luz.

“Agradeço a indicação, -- respondi. – Os pingentes são mesmo interessantes, mas preciso confessar que não tenho idéia do que fazer com eles. Aliás, preciso confessar que também não tenho muita idéia do que fazer com o resto, já que só descobri o mundo das contas há uma semana. Tudo o que sei, por enquanto, é que almejo a simplicidade.”

Depois de mandar o email é que percebi a incongruência entre a cabeça Bauhaus e o coração rococó, mas se achou esquisito alguém almejar a simplicidade através de estampas de oncinha, gatos de porcelana dourados e pavões art-nouveau, a minha correspondente não disse. Deve ter visto coisas piores, com certeza, porque foi psicóloga.

Um dia, a filha propôs começarem a vender juntas umas continhas pelo eBay; mais tarde foi embora para a universidade e largou o negócio no colo da mãe. Já vi muita gente fazer isso com gato e cachorro, mas com lojinha virtual foi a primeira vez. Joyce, que no ínterim se aposentou e toca o site com galhardia, gosta das contas, mas se arrepende de ter largado a profissão.

“As contas são um mundo fascinante, mas nunca deixe de escrever por causa delas”, recomendou. Mesmo que eu quisesse, ia ser difícil. As encomendas demoram tanto a chegar que, com sorte, eu talvez consiga montar uma pulseirinha antes do Natal.

* * *

Liguei para a Bia:

-- Arranjei um hobby!

-- Ahn?

-- Bijuteria. Vou fazer umas coisinhas com contas.

-- Ah, que bom. Você não tem mesmo nada para fazer, vai ser ótimo, vai preencher todas as tuas horas vagas...

Notei uma certa ironia. Não era o que eu queria ouvir. Principiantes precisam de estímulo. Liguei para a Laura:

-- Arranjei um hobby!

-- O que é?

-- Bijuteria. Vou fazer umas coisinhas com contas.

-- Que ótimo! Vai ser muito bom, trabalhos manuais são uma grande distração. E isso a gente faz em frente à televisão, conversando... ah, é uma delícia!

-- Estou me sentindo culpada, estou gastando pilhas de dinheiro numa coisa que nem sei direito o que é.

-- Se gastasse em terapia era muito mais caro. Está se divertindo?

-- Muito!

-- Então.

Mamãe, que estava na área, entrou na linha:

-- É melhor do que título de capitalização. E você tem netas. Se um dia enjoar das contas, dá para as meninas que elas vão ficar felizes.

Nada como um pé no chão.

* * *

O que eu disse para a Laura é a mais absoluta verdade: estou me divertindo horrores – e isso que as continhas nem chegaram. Descobri um mundo novo milenar, um autentico universo em expansão ao qual, por incrível que pareça, nunca tinha prestado atenção. Adoro enfeites, sobretudo anéis e colares, mas nunca parei para pensar como são feitos ou onde nascem. Também nunca parei para pensar que, por trás do mais humilde colarzinho, há milênios de História: uma das primeiras coisas que o ser humano fez quando desceu da árvore foi juntar umas pedrinhas bonitas e pendurar no pescoço. Daí para espetar cristais Swarowski em havaianas e capas de celular foi um pulo.

A quantidade de materiais, formas, cores e tipos de contas que existe é um espanto. Sei que estou constatando o óbvio para praticamente todo mundo, mas tenho esse jeito esquisito de, vira e mexe, descobrir uma pólvora qualquer e me encher de espanto.

* * *

Nunca entendi a ingenuidade dos índios ou das tribos africanas que negociavam tesouros verdadeiros com os conquistadores ocidentais a troco de contas e miçangas, mas hoje isso já me parece perfeitamente lógico. O que determina o valor dos tesouros é a sua raridade e o apreço que a comunidade lhes tem. Especiarias, pedras, ouro e prata eram conhecidos e comuns para as tribos; vidro não. É compreensível que trocassem o que tinham pelo que não tinham. E, a longuíssimo prazo, nem foi mau negócio – hoje algumas daquelas belas contas venezianas que atravessaram o oceano há quinhentos anos valem fortunas.

“Que pretensão a nossa de fazer pouco dos índios e dos africanos que trocavam contas por ouro!” escrevi para a Joyce. “Não é exatamente isso que estou fazendo? Não é exatamente isso que milhares de pessoas continuam fazendo, todos os dias?”

* * *

O mundo das contas tem mais acessórios, pecinhas, ferramentas e tipos de fios e correntes do que eu jamais teria pensado. Tem também uma quantidade espantosa de publicações. Mandei vir meia dúzia de livros da Amazon e, no momento, torço para que cheguem antes das contas, até para saber o que fazer com elas.

Mas, mesmo sem os livros, e mesmo sem as benditas continhas, passei a perceber as vitrines com outros olhos. Enquanto futuco a internet e cato uma conta no Nepal e outra na Itália, certas sequencias se formam na minha imaginação; se vou conseguir executá-las são outros quinhentos. Continuo achando lindo tudo de que já gostava, mas noto que talvez “escrevesse” aquilo de outra forma.

Afinal, cada um tem seu jeito de contar uma história.

(O Globo, Segundo Caderno, 25.3.2010)

Chamando todos os tangueiros!



Pessoas dançantes, é o seguinte: a dupla Juan Martin Carrara e Stefania Colina chega de Buenos Aires dia 31 de março, e fica aqui até o dia 9 de abril. Os dois, que foram sagrados Campeões Intercontinentais de Tango no ano passado, estarão disponíveis para aulas particulares.

Pessoalmente, do que gostei ao vê-los foi que os dois apresentam o tango como uma dança, e não uma demonstração de contorcionismo.

Quem sabe tudo sobre quando, quanto e onde é a Ju, minha sobrinha, que adora dança de salão e já teve aula com eles na Argentina. Podem mandar email para ela, ou deixar recados aqui nos comentários.

Uma nota triste


Passeando pelo YouTube atrás de Juan Martin e Stefania, descobri, para minha tristeza, que morreu, no último dia 7 de janeiro, o meu ídolo milongueiro, Tete Rusconi.

Um homem aparentemente comum, vestido como um burocrata e com uma barriga de corretor aposentado -- mas quando dançava...!

Tete tinha a pisada mais leve que se possa imaginar e, como se vê no video de Daniel Tonelli, uma alma em perfeito acordo com os pés.

Passou a noite de quarta-feira feliz, se acabando de dançar; e não acordou na quinta. Morreu enquanto dormia, possivelmente sonhando com os aviões que paravam para vê-lo rodopiar pelos ares.

Que dance em paz pela eternidade.

18.3.10

Antas S/A, a missão




Eu poderia começar dizendo que “Antas, unidas, jamais serão vencidas!”, mas, ainda que bonito, isso seria mentira; a verdade verdadeira é que “Antas, unidas ou separadas, serão sempre tapeadas”. Eu também já poderia esquecer esse assunto, mas várias antas continuam saindo do cofre e mandando emails, seja a respeito das suas trágicas experiências, seja alertando contra outras arapucas tão perigosas quanto os títulos de capitalização.

Um leitor observador perguntou por que só publiquei mensagens de mulheres na crônica da semana passada: seriam as mulheres mais suscetíveis a arapucas financeiras? Homem algum teria comprado título de capitalização, ou homem algum teria reconhecido que comprou? Nem uma coisa nem outra. Vários homens se manifestaram, mas escolhi os emails publicados pelo tom, e elas se mostraram mais identificadas comigo, o que é compreensível.

Ainda assim, partindo unicamente de observação pessoal, eu diria que nós, mulheres, somos, sim, mais desligadas em relação ao gerenciamento do dinheiro “grande”; pais, maridos e namorados tendem a assumir o comando financeiro da casa, e nós achamos essa situação muito confortável. Até porque é mesmo.

Há exceções aos montes, óbvio, e cresci ao lado de uma delas. Na nossa família, para bem estar de todos e felicidade geral do coletivo, acontecia o oposto. Mamãe, fera em matemática e equipada com um desconfiometro da melhor qualidade, sempre cuidou do lado prático da vida. Se dependessemos do talento administrativo do meu Pai, tadinho, estaríamos perdidas. Mas mesmo Mamãe, que percebe diferença de centavos no extrato do banco, tem título de capitalização:

-- Claro que tenho -- disse ela, e explicou: -- É pouca coisa, e fiz para agradar à gerente, que é extremamente gentil comigo. Considero uma espécie de taxa bancária.

Lógico que, ao contrário da filha, Mamãe não caiu no conto do vigário; ela sabia direitinho que aquilo não vale nada. O que me leva a crer que as mulheres não são mais suscetíveis a arapucas financeiras do que os homens, mas são, sim, mais suscetíveis às angústias e aos apelos dos outros -- mesmo que esses outros sejam gerentes de banco.

* * *

“Essa mensagem, eu sei, é extemporânea, pois creio que o assunto dos títulos de capitalização já deu frutos e deve ter-se encerrado, o que é bom, até mesmo para a nossa auto-estima”, -- escreveu o Luis Carlos, lá de São Paulo. “Só não escrevi antes por vergonha de admitir que eu, advogado experiente, defensor aguerrido do patrimônio de meus clientes, tenha também sucumbido à conversa mole de um gerente, que condicionou a aprovação de um pedido de aumento de cheque especial à compra de um título de capitalização. Não era mesmo o caso de me envergonhar? Havia, é certo, a possibilidade de eu ser contemplado em um sorteio, mas não comprei aquele título pensando nessa premiação de remota chance de concretização. Se eu tivesse apostado o dinheiro na Mega-Sena, minhas chances teriam sido bem maiores e, pelo menos, mais emocionantes. Além disso, apostasse eu aquele valor na loteria ou no bicho, poderia contar aos meus amigos do meu perfil agressivo e ousado no trato com o dinheiro. Mas jamais poderei pedir conforto ao meu melhor amigo pelo fato de ter sido ludibriado pelo "conto do título de capitalização". Quem sabe podemos abrir uma comunidade no Orkut: Eu comprei um título de capitalização!”

* * *

-- Você agora é comunista? -- espantou-se um amigo, que nunca me ouviu falar dessas coisas, quem dirá escrever. -- Começou uma jihad contra o sistema bancário? Quer acabar com os títulos de capitalização?!

Imagina. Comunista deixei de ser, se é que fui, quando a Primavera de Praga foi atropelada pelos tanques soviéticos, e eu já tinha bem uns 15 anos. Quanto ao sistema bancário, não conseguiria sobreviver sem ele e sem os empréstimos dos quais depende, habitualmente, o equilíbrio das minhas contas (estou dizendo, ninguém se auto-intitula anta sem motivo justificado).

Além disso, sou a favor da liberação total das drogas. Se alguém quiser consumir título de capitalização e for maior de idade, que vá em frente. É importantíssimo, no entanto, que o governo fiscalize o seu fornecimento, e obrigue quem os vende a não enganar o consumidor.

Empurrar anfetas para velhinhas que precisam de sossega-leão não é apenas crueldade, é crime.

* * *

Amiga querida que muito rala na vida artística me mandou três tuites seguidos:

“Aconteceu uma situação no banco agora que me fez lembrar de você. Pedi uma sugestão de onde aplicar dez mil reais. Adivinha?! O gerente me sugeriu capitalizações, não para rendimento mas para concorrer a um milhão! Meu marido tá passado, quer ir na agência. Só lembrei de você. Maior cara de pau que já vi na vida. E OI? Não eram 60 reais, mas dez mil! É muita cara de pau. Aff. Bjokas.”

* * *

Como dizem nas séries de tribunal inglesas, I rest my case. Só acrescento uma coisinha rápida, porque advogados do diabo sempre poderão argumentar que uma anta financeira confessa não é boa conselheira, e argumentarão certo. Mas na segunda passada, aqui mesmo neste jornal, o Roberto Zentgraf, que assina a coluna “Dinheiro em caixa” e é coordenador dos MBAs do Ibmec Rio (tá bom?), concordou em gênero, número e grau com a minha opinião a respeito dos títulos. Ele trouxe mais um bicho para o caixa, o mico, e mandou ver:

“Fuja deles, queridíssimo leitor, sempre!”

Pronto. Palavra de especialista.


(O Globo, Segundo Caderno, 18.3.2010)

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