30.4.11

Sobre o passado e o futuro


Um dia, no distante ano de 1993, aquele em que a até então melhor versão do Windows (3.1) veio dar às prateleiras, cheguei à conclusão de que não queria mais escrever mais sobre tecnologia. A única coisa que acontecia na área eram upgrades periódicos dos programas que se usavam então: Lotus (que me era indiferente), Wordstar (que eu detestava), WordPerfect (que eu adorava)... Imaginem uma cobertura baseada em novas versões do Office e terão uma idéia do quadro.

A própria internet, apesar de divertida, era muito fechada no Brasil e não estava ao alcance de todos. Eu trocava emails com meia dúzia de amigos, participava do fórum rec.pets.cats na Usenet e jogava MUDs, mas cada vez que escrevia sobre essas coisas obscuras recebia cartas de reclamações dos leitores, que em geral não tinham acesso àquilo.

De modo que procurei o editor chefe, e pedi para mudar de área: a sensação que eu tinha é que, se tivesse que escrever sobre mais um upgrade do CorelDraw ou do PageMaker, cortaria os pulsos. Ele compreendeu a minha falta de motivação, mas me pediu para segurar as pontas por mais uns meses, enquanto pensava no assunto e procurava alguém para o meu lugar.

E aí começou o ano de 1994, que trouxe consigo os primeiros servidores www brasileiros. A web -- que é, de fato, a internet como a conhecemos hoje – mudou tudo. A área voltou a ficar vibrante e interessantíssima. Havia tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que era impossível dar conta de tudo. Voltei à sala do editor e disse que tinha mudado de idéia, que amava tecnologia e que não queria escrever sobre outra coisa.

Passei assim os próximos anos, tendo crises de amor e ódio periódicas pela área. Cada vez que as coisas ficavam chatas demais, pronto! lá vinha uma novidade que mudava tudo.

* * *

No ano retrasado e em boa parte do ano passado, esse nosso mundinho hi-tech andou meio parado; na verdade, muito parado. Os desktops (e mesmo os notebooks) não chegam mais a ser novidade. Fazem o que se pede deles. Às vezes surge um modelo mais possante ou mais bonito, mas no fundo estamos apenas falando de uma nova embalagem para um produto consolidado, como falaríamos de uma novíssima linha de liquidificadores ou batedeiras. O iPhone fez sua estréia triunfal em 2007, todos os fabricantes tentaram fazer coisas parecidas, e foi só. E, mais uma vez, achei que estava me repetindo e escrevendo sobre as mesmas coisas, indefinidamente.

E aí apareceu o iPad, e na sua esteira todos os outros tablets, e tudo mudou de novo.

* * *

Conversando com Joel Schwartz, vice-presidente da EMC, que veio ao Rio para o Forum Econômico Mundial, discutiamos algo que nos apaixona igualmente, a nuvem (the cloud), quando ele me fez uma pergunta inesperada:

-- Como você vê a Microsoft daqui a alguns anos?

-- In the way of the dodo, -- respondi, “na direção do dodo”, pássaro extinto por sua incapacidade de perceber os perigos à sua frente, i.e., os humanos.

Ele concordou, e continuamos conversando, agora fazendo um pequeno exercício de futurologia sobre o papel da Microsoft no futuro, que, visto daqui, não é dos mais brilhantes.

Fato: assim como perdeu o bonde da internet, a todo-poderosa MS perdeu o bonde dos tablets, para não falar no ainda mais veloz bonde dos smartphones. À nossa volta, nas demais mesas do restaurante lotado com participantes do WEF (todos usuários de Blackberry), havia uma quantidade notável de tablets. O iPad 1 liderava, quase absoluto; muitos Samsung Tabs e vários iPad 2. Vi até um Motorola Xoom, que acaba de ser lançado, e ainda não chegou ao mercado com a força dos outros. Em nenhuma dessas máquinas há software da Microsoft, muito embora o padrão de documentos que nelas circula siga o padrão estabelecido pelo Office. Isso, porém, não quer dizer nada, porque as empresas encolhem ou somem e os padrões que criaram muitas vezes continuam vivos.

O que me choca de verdade é que, a essa altura do campeonato, a Nokia tenha escolhido de se juntar logo com essa empresa que ainda brilha nas bolsas, como uma estrela morta que ainda enxergamos mas que já não existe. Mas isso já é outro papo.

* * *

Comecei essa coluna com a firme intenção de escrever sobre o Xoom, mas, às vezes, as colunas são teimosas e seguem os seus próprios caminhos. Não quis contrariá-la. Na semana que vem, se ela me obedecer, falarei sobre este tablet tão interessante.


(O Globo, Economia, 30.4.2011) 

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