22.5.06


Celulares em cana: sobrou para o sofá


Como o proverbial sofá da sala do marido traído, os celulares viraram a bola da vez. Não houve uma autoridade suficientemente competente para aparecer na TV pondo os pingos nos ii; ao contrário, o que se viu foi o ministro Márcio Thomaz Bastos afirmando, após uma reunião com representantes de operadoras, que elas estavam "dispostas a colaborar", doando bloqueadores de celulares para o governo.

Não sei que espécie de conversa rolou naquela sala a portas fechadas, mas cada vez que vejo o ministro dando declarações deste tipo me lembro de personagens de filmes do Coppola ou do Scorsese. O que é que este governo não pede sorrindo que empresas prudentes não façam chorando?

A verdade é que as operadoras não têm rigorosamente nada a ver com o problema dos celulares nos presídios; jogar o problema nas suas costas é, mais do que reconhecer a total falência do estado no cumprimento da sua missão, tungar empresas que não têm qualquer culpa pelo mau funcionamento do sistema carcerário brasileiro.

Obrigar uma operadora a bloquear celulares em presídios é como obrigar a Ford ou a Volkswagen a pôr redutores automáticos de velocidade nos carros para que não corram diante de hospitais ou escolas. Ou fazer com que as Casas Bahia paguem as custas dos divórcios causados por traições conjugais cometidas nos sofás que vende.

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Bloquear celulares é o que há de tecnologicamente mais simples. Celulares são, basicamente, aparelhos de radiotransmissão. Os jammers, aparelhos que servem para bloqueá-los, fazem uso das mesmas freqüências, e podem interromper comunicações de qualquer tipo de telefone móvel, Nextel inclusive.

Eles são rotineiramente usados no exterior por forças policiais, quando há suspeita de que algum explosivo possa vir a ser detonado através de um comando enviado por celular; por empresas que têm medo de espionagem industrial; e, dizem as más línguas, até por hotéis que querem forçar os hóspedes a usar suas linhas absurdamente caras.

Embora o uso de jammers seja ilegal nos Estados Unidos, formas passivas de bloqueio já vêm sendo regularmente usadas em teatros e salas de concerto. Para isso, basta usar papéis de parede ou reboco com telas de metal embutidas, como aquelas de galinheiro, criando o que se chama de "Gaiolas de Faraday"; elas impedem a entrada e/ou saída de ondas eletromagnéticas em geral.

Hoje existem até bloqueadores pessoais de celulares, pequenos e delicados, que cabem no bolso e que dão ao proprietário o sossego de almoçar ou ir ao teatro sem o risco de ouvir campainhas à sua volta. Um brinquedinho desses pode ser comprado em qualquer loja de eletrônicos no Japão por aproximadamente R$ 150.

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Não, definitivamente não é culpa das operadoras se as autoridades penitenciárias deixam entrar celulares nos presídios. Ao que eu saiba, há presidiários e celulares em diversas partes do mundo, mas na maioria delas uns vivem afastados dos outros.

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Há coisa de um ano relatei aqui a experiência desastrosa que tive com uma atendente de call center da Telemar. Soube posteriormente que a moça foi demitida, e achei uma grande injustiça; ela era a ponta mais fraca da corda, que apenas repetia o script que lhe haviam dado. Até hoje me sinto mal em relação ao episódio. Minha intenção era chamar a atenção para a robotização dos call centers, e não prejudicar uma funcionária treinada para ser robô.

Na semana passada, vivi sensação oposta. Elogiei o excepcional atendimento que recebi de um rapaz do call center da Tim, cujo nome, tonta que sou, esqueci de anotar. Agora soube que se chama Marcio Santos Alves, está na empresa há nove meses e trabalha numa unidade especializada em demover clientes que querem trocar de operadora. Soube também que foi homenageado pelos colegas, e fiquei comovida com isso. Reitero os meus parabéns ao Marcio e à Tim, que pelo visto sabe motivar os seus funcionários.


(O Globo, Info etc., 22.5.2006)

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