2.10.07

Cá como lá

Na Inglaterra, tocada pela Vodafone, funciona lindamente a estrutura 3G já pronta, aqui, na Claro

Na tela do lindo Sony Ericsson que me fazia companhia, eu conseguia ver perfeitamente meu interlocutor: a imagem era nítida, sem as "quebras" costumeiras das videoconferências online. No canto inferior, à esquerda, a imagem que ele via, ou seja, eu, filmada pela minúscula câmera do aparelho. Conversávamos enquanto o ônibus rodava por Londres, numa cena exótica sob todos os aspectos para nós brasileiros -- a começar pelo fato de que, aqui, ninguém é besta de dar bobeira com um aparelho de última geração num coletivo.

Na Inglaterra, porém, a cena, que até outro dia era coisa de ficção científica, já não chama a atenção. Desde a chegada do 3G, a poderosa terceira geração dos celulares, em 2003, os ingleses, como a maioria dos europeus, têm à sua disposição uma série de serviços sensacionais. Que, talvez, já estejam a nosso alcance antes mesmo do fim do ano.

O pequeno grupo de jornalistas do qual eu fazia parte estava naquele ônibus justamente para ver, em primeira mão, do que é capaz a estrutura que já está montada aqui, pela Claro, esperando apenas o sinal verde do governo. Os serviços que serão oferecidos pela operadora brasileira serão, essencialmente, os mesmos que têm, hoje, os usuários ingleses da Vodafone.

Fazer videoconferências móveis é só uma das infinitas possibilidades da 3G, que se caracteriza por alta velocidade de transmissão, de um lado, e extrema sofisticação nos aparelhos, de outro. Mas, paradoxalmente, o que mais me impressionou de tudo o que vi foi um pequeno modem USB da Huawei, que promete banda larga a até 7.2Mbps e que, rotineiramente, me deu velocidades superiores a 4Mbps, ou seja, quatro vezes a minha atual linha doméstica de 1Mbps. Vale ressaltar que usei-o espetado ao velho Vaio de 2001, cuja capacidade de trabalho, já ultrapassada, atrapalha muito o desempenho do modem.

Nada menos que uma revolução social

O custo desse modem é relativamente barato (R$ 200; grátis numa versão mais simples que vai a 3Mbps), com tarifas de R$ 100 para uso ilimitado dentro do Reino Unido. O significado social de uma conexão ao mesmo tempo tão simples, tão rápida e tão barata, especialmente num país como o Brasil, onde banda larga ainda é artigo de luxo, não pode ser subestimado.

Nesse aspecto, estou inteiramente de acordo com João Cox, presidente da Claro:

-- Ainda está na lembrança de todos nós a época em que celular era coisa de rico, - diz ele. -- Depois da privatização, e com o fenômeno do pré-pago, o celular popularizou-se de tal maneira que gente que nunca tinha tido uma linha fixa passou a ter telefone. Acho que, com a chegada da 3G, vamos ver um efeito de democratização semelhante, só que em relação à banda larga.

Nem preciso dizer que o pequeno modem-maravilha já está na minha futura lista de compras: afinal, um dia, ainda vamos olhar para os dias da banda larga estacionária, conectada à casa, como curiosidade de uma tecnologia em desenvolvimento.

Johan Wibergh, presidente da Ericsson do Brasil, que também encontramos em Londres, confirmou o potencial da 3G como ferramenta de conexão ao informar que, nos países europeus onde já existe 3G, a venda de modems supera a de celulares.

É claro que um celular também pode ser usado como "ponte" para a internet, assim como qualquer outro telefone, mas os simcards vendidos com os modems estão vinculados a tarifas para dados, consideravelmente mais baixas. A Vodafone comercializa ainda uma placa Express Card, de mesma velocidade e preço do super modem USB de 7.2Mbps, mas essa só serve para os notebooks mais modernos.

Conversei muito com João Cox e Marco Quatorze, diretor de serviços agregados da Claro, sobre o problema das tarifas telefônicas, grande obstáculo para o uso mais intenso dos celulares. Os dois acreditam que, com a chegada da 3G ao Brasil, será possível operar a custos mais palatáveis para os consumidores, sobretudo por causa da escala: a nova tecnologia permite um uso mais flexível e inteligente do espectro de banda.

Marco Aurélio de Almeida Rodrigues, presidente da Qualcomm no Brasil, confirma, como seria de esperar, essa tendência: ainda que a Qualcomm não tenha envolvimento com o modelo de negócios das operadoras, é ela, através das suas tecnologias WCDMA e UMTS, quem está por trás do grande salto das telecomunicações para 3G.

O que se pode fazer com 3G?

Sou um pouco suspeita para falar das vantagens do 3G porque, como heavy user de celulares, já não vivo sem conexão internet permanente, ao alcance da mão (vá lá, até vivo, mas a falta que ela me faz...!). Ainda que as teleconferências móveis sejam impressionantes, não acho que sejam a maior vantagem da nova geração. O que faz toda a diferença é a sua velocidade de acesso, e tudo o que ela traz consigo.

Baixar músicas ou videoclipes no celular, que hoje nos parece rematada tolice, tanto por "alugar" o aparelho por um tempo interminável quanto pelos custos altíssimos, passa a ser uma atividade mais do que viável quando não se gasta, no processo, mais do que um ou dois minutos.

Ver televisão é outra coisa que nos parece inútil, se não impossível, até apreciarmos do que, de fato, estamos falando. É óbvio que ninguém vai substituir o telão da sala pela telinha do telefone; mas imaginem uma final de campeonato que pega os torcedores no trânsito ou no restaurante, um final de novela, um noticiário urgente. Com um aparelho 3G, ninguém precisa mais se despencar para casa correndo, ou parar em frente às vitrines de lojas de eletrodomésticos.

Os interesses dos brasileiros estão, por sinal, bem antenados com a realidade do mundo 3G. Uma pesquisa do Ericsson Consumer Lab revelou o que mais queremos fazer com as poderosas conexões da nova geração. Pela ordem: navegar na internet, videoconferências, IM, baixar músicas, consultar email, assistir televisão, compartilhar fotos.

O que menos empolga diz respeito a transações financeiras, cartões de crédito, informações para compras.

O mesmo laboratório acredita que chegaremos ao ano 2020 "com mais de 190 milhões de celulares, maior penetração nas classes D/E e a inclusão digital resolvida".

Como boa parte dos analistas do setor, vossa escriba entre eles, a Ericsson também vê a inclusão digital chegando através dos celulares, muito mais do que dos computadores. Basta isso: de 2004 a 2007, o preço médio dos celulares caiu 72% no Brasil. E ainda vai cair mais...


(O Globo, Info etc., 1.10.2007)

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