A bolsa ou a vida!
O que é mais cafona: uma bolsa Vuitton autênticaa R$ 3.500 ou uma falsificada a R$ 300?
Quem leu o Ela no sábado passado sabe: Maria Clara Diniz, a heroína da novela das oito, usava bolsa Vuitton falsificada. Inacreditável! A contravenção foi descoberta pelo diretor-geral da marca que, chocado com o faux-pas da produção, prontamente enviou para a Rede Globo uma bolsa original. Agora, o pessoal da Delegacia de Repressão contra os Crimes de Propriedade e Material (que não se perca pela extensão do nome), recém-criada aqui no Rio e primeira do Brasil, já pode respirar aliviado: sai a bolsa cafona de R$ 300, entra a bolsa cafona de R$ 3.500.
Embora, tirando o atento diretor-geral da Vuitton, ninguém vá reparar na diferença.
É muito grave o problema social criado pela bolsa Vuitton falsificada. Medidas urgentes têm que ser — e serão! — tomadas para garantir que a patroa, ao sair pelo elevador social com sua bolsa comprada a peso de euro, de ouro, em Paris, não passe pelo constrangimento de cruzar na portaria com a empregada, que entra pelo elevador de serviço, portando uma bolsa não-Vuitton, igualzinha, comprada a dez real ali na esquina. Onde é que nós vamos parar? Assim, vamos acabar batendo com a cabeça na igualdade.
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Não há, numa bolsa, material ou qualidade de trabalho que justifiquem um preço desses; a não ser, é claro, o valor intangível daquelas letrinhas estampadas, cuja única finalidade é proclamar aos céus que ali vai uma pessoa com muito dinheiro e pouco critério. Em suma: um otário. Feminino, na grande maioria dos casos.
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Mas há uma perversidade na relação custo-benefício de uma bolsa Vuitton, um exagero de consumo, que me revolta pela evidente agressão social que projeta. Há uma profunda deselegância moral naquelas letrinhas estampadas. Seriam mais honestas se fossem cifrões. Que me desculpem a Maria Clara Diniz, o diretor-geral da marca e as moças todas que andam por aí de Vuitton a tiracolo, falso ou verdadeiro. É tudo falso.
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Para mim, a qualidade fundamental do ser humano é a bondade, e essa o ministro já provou que não tem. Uma pessoa que não preza o seu semelhante, que não leva em consideração os sentimentos e o bem-estar dos outros — ainda por cima quando esses outros são, justamente, a parcela mais frágil da população — não merece crédito nem confiança.
É no mínimo desconcertante verificar que o governo do PT — supostamente “popular” — não pensa assim. Ao classificar a barbaridade que se viu como um simples “erro operacional”, o presidente Lula perdeu (mais uma) ótima chance de ficar calado.
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(O Globo, Segundo Caderno, 13.11.2003)
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