3.6.10
Ruim com ela, pior sem ela
Depois de escrever sobre a Suipa, na semana passada, recebi diversos emails, todos mais ou menos do mesmo teor. Resumindo, eles diziam mais ou menos o seguinte: “Ruim com ela, pior sem ela”. Faz sentido. Quem conhece a situação dos bichos abandonados do Rio de Janeiro e o trabalho da Suipa sabe que, apesar da superlotação e da desorganização geral, ela ocupa um espaço absolutamente vital na cidade.
Entraram em contato comigo associados e amigos da Suipa, voluntários antigos e atuais, protetores de cães e gatos. Alguns chegaram a questionar os motivos da promotora que abriu fogo contra a instituição, mas houve consenso em relação aos vereadores que ocuparam os holofotes da mídia pedindo uma CPI: eles não passam de bactérias oportunistas, que só querem aparecer. Também houve gente de pé atrás com a creche subitamente construída ali ao lado, de onde partem, agora, queixas em relação aos cães, ao barulho, ao mau cheiro. Ora, vai dizer que, antes de construírem a tal creche, seus proprietários não sabiam onde estavam?
De tudo o que me foi escrito e contado, porém, o mais importante foi o email enviado pelo dr. Renato Campello Costa, presidente da Comissão de Clínica e Bem Estar Animal do Conselho Regional de Veterinária. Coube a ele fiscalizar e avaliar as denúncias na esfera da medicina veterinária, para apuração dos fatos.
“Para melhor avaliação da Suipa nós a separamos em duas, a clínica veterinária e o abrigo.“ escreveu o dr. Renato. “Na clínica veterinária que ali funciona não encontramos nenhum sinal de maus tratos aos animais de forma deliberada, ao contrário do que foi amplamente divulgado na imprensa. Observamos, isso sim, médicos veterinários capazes e dedicados, exercendo sua profissão com dignidade. Já o abrigo é outra história, que pormenorizamos no relatório anexo, mas que deve, ainda assim, ser analisada com muito cuidado.”
O dr. Renato me pediu que lesse o relatório que encaminhou ao presidente do CRMV, dr. Romulo Spinelli, “para que possamos trazer à baila a realidade dos fatos, isenta de opiniões parciais ou desprovidas de veracidade, com intuito de fazer justiça aos profissionais que ali trabalham dignamente e também para ajudar, de fato, os animais abandonados.”
Nem precisava ter pedido. Li o relatório com o maior interesse. Também liguei para o dr. Renato, que me contou uma coisa curiosa:
-- Eu tenho uma clínica na Barra da Tijuca. Trabalho, como você pode imaginar, num universo radicalmente oposto ao da Suipa. E, quando fui para lá, influenciado pelo que tinha lido nos jornais, achei que ia cair numa sucursal do inferno, num autêntico campo de concentração para bichos. Pois, quer saber? Apesar de todos os problemas que encontrei, fiquei surpreso com o que vi lá.
“No atendimento de rotina da clínica trabalham 28 médicos veterinários realizando atendimento clínico, cirurgias, exames laboratoriais e exames complementares, como ultrassonografia e eletrocardiograma,“ diz o relatório oficial. “Na recepção é feita uma triagem dos cerca de 150 animais atendidos a cada dia para encaminhamento aos consultórios, que se encontravam em boas condições de higiene, assim como a sala de cirurgia, o laboratório e as salas de hidratação. Algumas salas estão em construção e reforma, assim como um novo canil de recebimento de animais. Talvez em função das obras e do elevado número de animais atendidos, é clara uma necessidade de melhor organização e arrumação das salas, mas nada que deponha contra as condições dos médicos veterinários que ali prestam os atendimentos clínicos.”
O problema é o abrigo: “Esta área encontra-se em condição realmente caótica, com grande número de animais abrigados juntos. Há também gaiolas para os doentes que necessitam de cuidados especiais e não podem ser alojados junto aos demais. O espaço é insuficiente. Alguns ficam apenas presos em coleiras, pois não há gaiolas para todos. Não observamos em momento algum “maus tratos” aos animais, mas, indubitavelmente, as condições para tratá-los não são as ideais. Pudemos, inclusive, verificar o momento em que foi recebido um cão abandonado em situação crítica, com lesões desfigurantes na face e com alterações neurológicas evidentes. Tal animal, mesmo em condições ideais, provavelmente teria pouca chance de sobreviver. A Suipa funciona em situação precária para abrigar os animais sem dono, mas qual outra instituição o faz?”
“Ficou claro que as notícias veiculadas nos últimos dias, dando conta de que a mortalidade de animais abandonados estaria em alarmantes 98 %, não procedem. Certamente muitos desses animais abandonados morrem, mas é preciso notar em que estado chegam (e são aceitos!). São animais sem dono ou animais cujos donos não têm condição ou vontade de tratá-los, e que não têm outra opção.
Em resumo, eu diria que a clínica da Suipa funciona em condições satisfatórias diante do que se propõe a oferecer. Já em relação ao abrigo para animais abandonados, as condições são, sim, insalubres, mas são melhores do que se eles fossem deixados do lado de fora, para perecer sem qualquer assistência.”
(O Globo, Segundo Caderno, 3.06.2010)
2 comentários:
Quanta hipocrisia, está foi exatamente a descrição que faço da Suipa, não podem realmente maltatrar animais pois isto é crime. Mas o lugar é mesmo o que se pode chamar de Sucursal do Inferno. Nojento, com funcionariios mau- humorados, barulhada do metrô em cima, um confusão absurda. Me alivei quando sai de lá.
Quanta hipocrisia, está foi exatamente a descrição que faço da Suipa, não podem realmente maltatrar animais pois isto é crime. Mas o lugar é mesmo o que se pode chamar de Sucursal do Inferno. Nojento, com funcionariios mau- humorados, barulhada do metrô em cima, um confusão absurda. Me alivei quando sai de lá.
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