Encaminhei o email para o Ibama, para saber o que tinha de fato acontecido. Na semana passada, recebi resposta do biólogo Carlos Magno Abreu, da Superintendência do Rio de Janeiro. É um longo email, no qual ele fala do trabalho tantas vezes incompreendido do Ibama, e ao qual anexa a manifestação dos técnicos que apreenderam o papagaio e arara que motivaram a denúncia da Valéria. Entre outras coisas, ele diz, com absoluta razão:
"Algumas pessoas ainda acreditam que estão cuidando bem de seus pássaros, como se a disponibilizarão de água e de alimentos, muitas vezes deficiente, pudesse compensar uma vida inteira atrás das grades e ainda acreditam, muitas vezes de boa fé, que estão contribuindo para a preservação do meio ambiente. Cumpre-nos informar-lhes o quão equivocada é essa noção. Para cada animal traficado que chega vivo ao seu destino final, outros nove, no mínimo, vêm a óbito."
A seguir, o que escreveram os técnicos. Eles não são gentis com a Valéria, a quem respeito muito e que é uma das vozes mais atuantes na defesa animal, mas é preciso reconhecer que ela também não teve a devida consideração pelo trabalho deles, que enfrentam todo tipo de dificuldade e constrangimento em prol do meio-ambiente e do bem-estar dos bichos:
"Efetuamos a apreensão, há cerca de dois anos, de uma arara canindé e de um papagaio verdadeiro, que encontravam-se engaiolados no interior do Parque Municipal Cremerie, em Petrópolis. Fomos lá motivados por denúncia da Linha Verde (0800-618080). No local, constatamos que os animais não tinham comprovação de origem legal, o que caracteriza que foram capturados na natureza, fato extremamente danoso ao meio ambiente e que a legislação tenta resguardar, sendo, por isso mesmo, considerado crime e infração administrativa, segundo estabelece a legislação vigente, a qual os servidores públicos devem se ater para que não incorram em prevaricação.
Ao contrário do afirmado na denúncia, os animais não se encontravam soltos e bem tratados. A alimentação e os recintos eram inadequados para as espécies. Segundo funcionários do local, os animais estavam no parque há mais de 20 anos, no entanto, sem comprovação. Os recintos não ofereciam condição de vôo, nem abrigo às intempéries e demais incômodos alheios aos seus hábitos naturais. A alimentação era fornecida pelos vigilantes do parque e consistia basicamente de sementes de girassol, inadequada e desbalanceada em termos nutricionais por sobrecarregar de gordura o fígado, podendo vir a causar danos ao animal, como já aparentava haver, a julgar pelo papagaio, que se encontrava com o fígado inchado. Informaram-nos que não havia tratadores ou atendimento médico-veterinário para os animais.
A senhora Valéria Serra Cordeiro, em mensagem deselegante e desinformada, encaminhada por e-mail, certamente não conhecia as aves em questão, além de desconhecer a legislação pertinente. Essa senhora teceu alguns comentários lamentáveis, para quem se arbitra no direito de cobrar deveres de outrém. Diz a reclamante que a ação do Ibama foi "abusiva e ridícula". Fomos ao local motivados por denúncia anônima (dever de ofício) e constatamos a precariedade com que os animais ali se encontravam alojados. Além das gaiolas enferrujadas, a impressão que tivemos foi de que os animais estavam quase abandonados, não fosse o suprimento de sementes de girassóis fornecido a eles. Ademais, Petrópolis tem clima frio, e como ressaltado acima, as aves não possuíam condições de se abrigar adequadamente. Se, de fato, estavam lá há 20 anos, isso só explicita o descaso do poder público local para o cativeiro ilegal de fauna, além da complacência de parte da sociedade dita letrada.
Alega ainda que os animais "viviam superbem" e que foram "retiradas do local onde viviam felizes há 30 anos". Talvez em sua míope visão passar 30 anos trancafiados em uma gaiola, sem companhia de seus semelhantes e comendo somente sementes de girassol, seja considerado viver bem e felizes... sem comentários.
Diz ainda em sua mensagem que "não sei sob qual alegação" os animais foram apreendidos e que "não podemos deixar essas aves, que sempre viveram em liberdade, fora de perigo e bem tratadas, serem confinadas ou comercializadas". Muito simples, senhora: a alegação é tão somente cumprir a lei 9605/98, para resguardar o meio ambiente equilibrado e a saúde dos animais, conforme exige o artigo 225 da Lei Magna brasileira.
Chama atenção, além disso, a falta de informação ao alegar que estavam em liberdade. Ora, se estivessem livres não teriam sido apreendidas, pois o artigo 29 da Lei de Crimes ambientais explicita que o cativeiro de animais silvestres sem comprovação de origem legal é crime. Não dá pra entender como animais engaiolados há 30 anos possam ser considerados em liberdade. Talvez, somente na pouca visão dessa senhora, que pelo que se percebe em sua mensagem, soube do ocorrido por ouvir dizer e que ignora a legislação vigente, ainda desrespeitando e difamando os servidores do Ibama, que lutam no dia a dia para minimizar o tráfico de animais silvestres. O Ibama não vende, nem jamais vendeu, animais. Se ela sabe de alguma informação nesse sentido, que seja mais específica, para que sua denúncia seja prontamente apurada.
Os animais apreendidos foram encaminhados ao Centro de Triagem do Ibama, para poderem receber tratamento adequado e, aí sim, digno, pois caso não possam ser libertados em seu habitat natural, em decorrência das agruras dos longos anos em que estiveram confinados, solitários e mal alimentados, poderão conviver na companhia de seus semelhantes.
A ignorância é audaciosa."
Rodrigo de Carvalho - Biólogo - IBAMA/RJ
Valéria de Oliveira Penna Firme - Analista Ambiental - IBAMA/RJ
Adalberto de Oliveira - Agente de Fiscalização - IBAMA/RJ
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