26.3.03



A caravana passa

Acho que Élio Gaspari -- com quem mais concordo do que discordo -- pisou na bola ao comentar o "Caso Michelle" -- uma tempestade em copo d'água causada pela ida da cadelinha do presidente da Granja do Torto para o Alvorada numa Kombi do governo. Élio condena o fato, e tece considerações em relação aos custos de alimentação de um cão num país com tantos esfomeados.

Não é por aí. Há várias coisas de que não gosto no atual governo, mas um animal de estimação no Palácio certamente não é uma delas; pelo contrário. Acho que ao demonstrar afeto por sua cadelinha, Lula dá um excelente exemplo para todo mundo. A vida de uma pessoa que ama animais é muitíssimo mais rica do que a de quem acha que bicho é luxo. Rica num sentido que o Gaspari, que passou anos implicando com as alíquotas para a importação de ração para gatos, jamais vai entender -- mas que qualquer mendigo acompanhado do seu vira-lata conhece muito bem.

Ainda agora bateu na minha mailbox do Globo uma excelente carta a respeito do assunto, dirigida ao ministro José Dirceu por Ana Maria Pinheiro, militante ambientalista há mais de 30 anos e presidente da entidade zoófila União em Defesa da Natureza, que faz parte do Forum de Proteção Animal. Vejam alguns dados que ela aponta:
Gostaria de lembrar a V. Exa. que o chamado "pet business", negócio de produtos voltados para animais de estimação, segundo o jornal O Estado de São Paulo, de 24.10.2002, movimenta um mercado de R$ 5 bilhões. A reportagem informou: "O aquecimento dos negócios tem chamado a atenção até mesmo de grupos internacionais que resolveram investir na realização da primeira edição da Pet South America, feira que começa hoje, no Transamérica Expo Center, em São Paulo, e vai reunir mais de 200 expositores." A mesma reportagem informou que o setor "pet" cresceu 21% em 2001. No final de 2001, existiam no Brasil 8.000 lojas especializadas em animais de estimação, com um total de 40.000 pontos de venda em lojas em geral.

Segundo a revista Veja São Paulo de 7.8.2002, um em cada dois lares de São Paulo tem seu cachorro de estimação. São Paulo possuia na ocasião 4.700 "pet shops", para 4.000 farmácias e 3.200 padarias. Em 2001 foram abertas em São Paulo aproximadamente 1.000 "pet shops".

Pesquisa Ibope de 2000 informa que em 59% dos domicílios brasileiros existe um animal de estimação, 16% dos brasileiros com mais de 16 anos possuem gatos, 44% possuem cachorros e 15% possuem outros bichos, como pássaros e peixes.

Se considerarmos que em cada loja especializada trabalhem aproximadamente 5 pessoas, para a limpeza, venda de produtos, prestação de serviços como banho, corte de pelo, incluindo um veterinário responsável, vemos que apenas as "pet shops" empregam 40.000 pessoas, sem contarmos os trabalhadores empregados nas indústrias que produzem toda sorte de artigos, desde alimentação a roupas, coleiras, produtos de limpeza, remédios, serviços de diagnóstico e clínicas veterinárias que não possuem lojas anexas. São empregos de todos os níveis de especialização, muitos não requerendo especialização nenhuma. Para brasileiros que chegam às grandes cidades, oriundos do meio rural, onde adquirem experiência "lidando com criação", como dizem, tais empregos são preciosos e vêm de encontro ao que essa mão-de-obra sabe e aprecia fazer. Não será difícil para o Ministério do Trabalho calcular exatamente o número de empregos criados pelos animais de estimação.

As "pet shops" informatizaram-se para melhor atender ao mercado, indicando a demanda também por produtos de informática. Os remédios veterinários movimentaram em 1998 nos Estados Unidos US$ 3,6 bilhões. Há condomínios de luxo que oferecem instalações de hotelaria para animais, existindo ainda hotéis específicos para sua hospedagem, quando seus donos não os podem ter em casa por um curto período. Isto tudo representa maior movimentação de dinheiro e mais empregos.

A produção nacional de ração para cães e gatos saltou de 220.000 toneladas em 1994 para 1.170 .000 em 2001.

Segundo dados da Anfal-Pet, apenas 35% dos animais de estimação no Brasil consomem ração. O objetivo das empresas do setor é atingir um consumo de 50% no país, com um aumento substancial de faturamento, de recolhimento de tributos e de criação de empregos.

Um dos três centros de pesquisa da Royal-Canin, empresa líder do mercado de alimentos secos para animais na Europa situa-se em Descalvado, interior do estado de São Paulo.

Portanto, condenar o presidente da República e dona Marisa Letícia por servirem de exemplo de amor aos animais é atitude anacrônica, é caminhar na contramão do sentimento nacional e do desenvolvimento de um negócio que só traz vantagens para o país.
Estou totalmente de acordo.

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