16.2.04



Redi

Eu vinha voltando para casa no sábado à tarde quando a Eliana Caruso me avisou, pelo celular, que o Redi havia morrido. Eu estava na Visconde de Pirajá, indo em direção à Vinícius, atravessando um bloco qualquer, e tudo me pareceu, de repente, extremamente irreal: receber uma chamada no meio da rua, passar por aquele monte de gente fazendo barulho e, sobretudo, saber daquela morte, daquele jeito.

Tenho pensado no Redi desde então. A sua própria figura era meio irreal. Nós nos conhecíamos há mais de vinte anos, nos víamos relativamente pouco (ele morava em Nova York) mas, do pouco que eu via, gostava muito -- embora nunca tenha ficado claro para mim quem, de fato, era Sílvio Redinger, o Redi.

Havia toda uma mitologia a seu respeito entre os amigos. Ele era o personagem desajeitado e perpetuamente desligado em torno do qual circulavam mil histórias -- algumas rigorosamente verdadeiras -- sobre a inaptidão e a perplexidade do ser humano diante do mundo.

Redi cultivava essa imagem e essas histórias. Era o primeiro a contá-las, aparentemente resignado, se não contente, com sua incapacidade de adaptação ao planeta. Mas é óbvio que devia haver nele, também, um fio terra bastante bem conectado, ou não teria sido capaz de perceber, com tanta graça e clareza, as incongruências da vida e as sutilezas da cuíca, que tocava como ninguém.

Tudo podia acontecer -- e em geral acontecia -- com o personagem Redi; menos morrer.

Isso não estava no script, não combina, não faz sentido.

Afinal, a graça é que ele sempre sobrevivia a si mesmo.

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