11.1.03



Expresso de Shangai

Quase duas da manhã e, no quarto 1001 do The Westin Shanghai reina a mais completa desordem: estou tentando fazer tudo caber numa mala só. Não é nem que tenha comprado tanta coisa, é que estou sem paciência de dobrar direitinho todos os casacos, capotes, gorros e luvas que usei aqui.

A questão das compras, aliás, merece consideração. O preço de tudo que não seja eletrônico ou importado é muito barato aqui, mas é impossível comprar uma caixinha de incenso de alguns centavos sem discutir meia hora com o vendedor a respeito do preço final. Não há um preço "certo" para nada, há simples hipóteses de trabalho: eles geralmente pedem três vezes mais do que estão dispostos a aceitar, e cabe ao freguês ter disposição e talento para reduzir o custo do que deseja comprar.

Sob este aspecto, veio à China a Rónai mais errada possível. Mamãe teria resistido valentemente a todas as tentações; a Laura teria feito eles saírem no prejuízo; e a Bia teria comprado o estritamente essencial e justificável, pelo preço correto. Já eu...

Ainda assim, não posso me queixar: esta pechincha obrigatória é que me salvou da ruína, porque deixei de comprar muita coisa por falta de saco para ficar fazendo cabo-de-guerra na calculadora com os vendedores. Temos, orientais e ocidentais, visões radicalmente diferentes do que deve ser uma operação comercial bem sucedida. Para nós, quanto mais rápido se resolva a questão, melhor; para eles, o importante é discutir preço e mercadoria nos mínimos detalhes, nem que isso leve o dia inteiro.

O sistema é o mesmo na China e em todo o Oriente, e acredito que parte do pressuposto de que uma venda é, antes de mais nada, uma interação social. Isso devia fazer muito sentido há algumas décadas, num mundo sem pressa e sem cinema ou televisão, em que comprar e vender era possivelmente uma das maiores distrações, e talvez faça sentido até hoje entre pessoas que moram na mesma cidade e falam a mesma língua... mas como é enervante numa loja de lembrancinhas, onde ninguém se entende e todos estão de passagem!

Quando eu chegar em casa volto a falar nisso; o lance todo é muito interessante.

Até lá!

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