4.11.04





O Rio de Janeiro continua lindo

Felicidade: uma longa pedalada noite adentro

O Millôr gosta muito de usar uma frase que, há tempos, é piada particular na nossa roda: "Cuándo yo pienso que yo soy general del glorioso ejército de la Republica del Paraguay, yo me tiemblo de mi mismo". Não tenho noção de onde ele tirou isso, mas no sábado passado me senti meio assim. Quando lembro que passei quase seis horas andando de bicicleta, yo me tiemblo de mi misma.

Tudo começou da forma mais simples possível. Não resisti à luz deslumbrante lá de fora, peguei a câmera e fui para a Lagoa. Parei no Cantagalo para fotografar o casal de quero-queros e a minha garcinha branca favorita, que acompanhei enquanto pescava o jantar e que consegui, até, fotografar de caranguejo no bico. É mansinha e, se a gente não fizer movimentos bruscos, pode passar a tarde a seu lado, que ela não se incomoda.

No Cantagalo me encontrei, por acaso, com um ótimo amigo que só conhecia de internet (viva, André, até que enfim!); com a Marcela, minha vizinha de porta, acompanhada pelas duas cadelinhas que, até hoje, desafiam o entendimento dos gatos; e com o Ney Latorraca, que mora logo ali, e que me contou uma ótima história de encontro com a capivara.

Depois de toda a social, segui pelo lado da Curva do Calombo e parei na altura do Vasco para ver a outra capivara, que anda meio arredia. Já estava escuro, não havia mais um fiapo de luz mas, usando o tronco de uma árvore como apoio para a câmera, ainda consegui fazer uma foto dela. É certamente a pior foto de capivara do mundo, mas pelo menos o momento ficou registrado...

De lá passei no clube, onde desencontrei da Bia para a aula de spinning das seis e meia (até porque já eram quase oito), mas me encontrei com a Renata Sabóia, que consegue manter a linha mesmo fazendo os melhores sorvetes do planeta. Conversamos sobre uns sabores tentadores que vão entrar em cartaz no verão, tomei um café e segui em frente. Quando estava na reta para casa (pedalando -- yes!!! -- sem as duas mãos) vi a lua surgindo, linda linda, por trás da montanha. Parei encantada e, enquanto tirava mais fotos, decidi correr até a praia. Uma lua daquelas, sinceramente, tinha que ser fotografada sobre o mar.

O detalhe é que, até então, eu ainda não havia saído de bicicleta pelo meio do trânsito, muito menos do trânsito noturno. Mas lá fui, assim mesmo. Peguei a Vinícius e consegui chegar à Vieira Souto pelo meio dos carros e do povo sem atropelar ninguém e sem me machucar; da ciclovia de Ipanema fui até o Arpoador, segui para Copacabana e, viva! ainda peguei a lua cheia, redonda como um tamanco, iluminando os pescadores do Posto Seis.

A noite estava tão bonita, porém, que decidi continuar. Parei de novo logo adiante, para fotografar a estátua do Drummond (que ainda não conhecia) e, de lá, fui até o Copacabana Palace, de onde comecei a jornada de volta.

No meio do caminho, encontrei a Claude Amaral Peixoto com seus dois cãezinhos, muito parecidos com os da Marcela. Demos um tempo num quiosque para pôr a vida em dia e, na seqüência, enquanto ela ia passear com os bichinhos, eu voltava para a ciclovia.

Minha idéia era ir direto para casa, mas tive que parar no Posto Seis. É que havia uns pássaros interessantíssimos perto do mar, uns três martins-pescadores e uma meia dúzia de outros, que nunca tinha visto, meio parecidos com pingüins e com um penacho branco bem comprido. Carreguei a bicicleta para areia e lá fiquei, contente, observando como driblavam as ondas. Ainda tentei fotografá-los também, mas eles não me deixaram chegar suficientemente perto -- e milagre, afinal, a câmera ainda não faz.

Considerando que já era quase meia-noite e que, àquela hora, até as capivaras já estariam dormindo, me despedi deles e toquei para Ipanema, onde refiz o caminho da ida, às avessas. Na Vinícius, comi duas empadinhas de camarão no botequim que fica ao lado da Casa Nelson e, pouco depois, estava em casa, contemplando, no computador, a colheita do dia. A primeira foto da tarde foi feita no bosquezinho em frente de casa, às 16h58; a última, dos pássaros, às 23h17.

Foi uma tarde puxada mas dormi feliz, de alma leve. No dia seguinte, o resultado das eleições completou o fim-de-semana perfeito.

* * *

Mudando de assunto: juro que não entendi o auê contra os médicos que atenderam a Cássia Eller. Uma pessoa bebe todas, cheira todas, chega ao hospital nas últimas -- e a culpa é dos médicos? A overdose foi de Plasil, é isso? Acho que está faltando bom senso nessa história. Ou boa fé. Enquanto isso, ainda não li uma linha sobre os veterinários que atendiamm os galos nas rinhas recentemente estouradas. Quem são -- e onde estão -- esses Harry Shibatas do mundo animal?

(O Globo, Segundo Caderno, 4.11.2004)

Os leitores do blog, naturalmente, já leram esta crônica -- ou quase ela -- antes. Na verdade, a sugestão de que o post sobre o passeio fosse publicado no jornal partiu daqui mesmo, dos comentários; valeu, gente! :-)

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