De notícias e não notícias
faz-se a crônica
As notícias, porém, não têm ajudado:dengue, violência, dossiê, bolsa-ditadura...
No "Prosa e verso" do sábado passado, José Castelo descreveu a crônica como "o gênero da leveza, que combate o tédio e repudia o desgosto". Achei linda a definição e concordo com ela, embora reconheça que está cada vez mais difícil fazer por onde merecê-la. A cidade está infestada de mosquitos, o país está infestado de ratos, a violência cresce, os impostos aumentam, as autoridades mentem, os tibetanos apanham, a bolsa-ditadura desmoraliza a luta dos idealistas em benefício dos cínicos. Repudiar o desgosto é uma impossibilidade física e filosófica — mas, a despeito das circunstâncias, a gente segue tentando.
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Sábado, por exemplo. Nove da noite, chuvinha caindo, gato doente. Três fortes motivos para um bípede de joelho seqüelado ficar em casa. Felizmente ignorei-os, e me despenquei para o outro lado do mundo para ver o Rod Stewart. O show foi ótimo, e a HSBC Arena foi uma revelação: uma casa gigantesca mas muito confortável, com som impecável e telões nítidos, brilhantes. Com isso, e com a simpatia de Rod Stewart, mesmo quem estava a uma distância enorme do palco, como eu estava, tinha certa sensação de intimidade, de estar vendo um velho amigo logo ali.O repertório ajudou. Quem vai a show de Rod Stewart não quer ouvir novos lançamentos. Quer recordar os clássicos, quer dançar, quer cantar junto. Quer, enfim, ver o Rod Stewart que imagina, e não uma reinvenção cheia de novidades. E não é que fomos atendidos? Teve "Sailing", "Tonight's the night", "You're in my heart", "Have you ever seen the rain?", "Heartache", "The first cut is the deepest". Teve também três backs roliças diretamente saídas da versão musical de "Pequena loja de horrores", e um roadie que atravessou o palco na maior calma, carregando uma escada. Até agora estou na dúvida se foi aposta("Quantas cervejas você me paga para eu atravessar o palco?") ou pegadinha com o público ("Você notou alguma coisa estranha durante o show?"). Em suma, uma noite e tanto, que me convenceu que a Arena, ao contrário do que eu pensava, vale a viagem.
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Os estudantes, ou pelo menos alguns deles, saíram finalmente da catalepsia em que estavam mergulhados desde que a UNE foi contemplada pelo governo com tantas e tão ricas verbas. O banzé que aprontaram na UnB é a primeira notícia boa a sair de Brasília em muitos e muitos anos. Há quem os condene dizendo que estão usando os mesmos métodos do MST. Não é por aí. O MST deixou há tempos de ser um movimento de agricultores sem terra, se é que algum dia o foi, para se tornar um partido organizado e violento que vem, sistematicamente e com grande exito, testando os limites da lei. Se amanhã virar uma espécie de Farc à brasileira com molho campesino, só será surpresa mesmo para o presidente.Já os estudantes estão mostrando a sua insatisfação do único modo que lhes restou. Estão diante de uma administração corrupta que fez pós-graduação na Esplanada dos Ministérios e que está se lixando para quem lhe cobra a dignidade de, pelo menos, sair de fininho. O que querem que eles façam? Um abaixo-assinado? Uma passeata contra lixeiras a R$ 990? Um abraço na reitoria, de preferência usando camisetas brancas? Mandem ver, meninos! E, depois de expulsar o Magnífico Reitor, aproveitem o embalo e dêem um rolé na Praça dos Três Poderes.
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Ah, e o tal dossiê?! Se não fosse no nosso país, seria até engraçado acompanhar as várias versões que o governo tem apresentado para justificar o injustificável, e a discussão que se trava para saber se a culpa é de quem faz um dossiê mal-intencionado ou de quem o divulga. Como se fosse possível discutir se é mais grave cometer um crime ou dizer que um crime foi cometido.Enquanto isso, pouco se fala no xis da questão, que é a total falta de transparência dos gastos da presidência. Presidentes da República têm direito a algumas mordomias, nisso estamos todos de acordo, mas por que cargas d'água essas mordomias têm que ser escondidas de quem paga as contas? Em que fica afetada a segurança nacional com a compra de lixas de unha ou de lençóis egípcios? Que se abram logo todas as contas desta e de todas as presidências, ora bolas. Qualquer outra coisa é cortina de fumaça.
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É justo que Jaguar e Ziraldo ainda tenham trinta dias para recorrer da decisão da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça que lhes deu, respectivamente, R$ 1.027. 383,29 e R$ 1.253.000,24, mais pensão mensal de R$ 4.375,88. Acho que devem pedir mais, bem mais. Os dois ganharam muito pouco para jogar no lixo biografias até aqui tão bacanas.(O Globo, Segundo Caderno, 10.4.2008)
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