7.12.04



Orelha

Escrevi este texto para O livro de ouro da comunicação, de Silvana Gontijo -- um livro excelente, que teve a sorte de ganhar uma edição à altura do texto, bem diagramada e cheia de ilustrações. O livro chegou às livrarias no mês passado.

Quantas vezes já não ouvimos alguém, olhando a cara particularmente expressiva de um cachorro ou de um gato, dizer que ele ?só falta falar?? Se por ?falar? entendermos o que de fato está implícito na palavra -- a capacidade de comunicação -- não falta, não; os bichos ?falam? até muito bem, obrigado. Nós é que não entendemos a língua deles. Ou, eventualmente, não temos a percepção dos detalhes; mas, por experiência própria, posso garantir que é mais fácil adivinhar o que me ?diz? um gato na China do que o que me diz um chinês, até porque falamos, ele e eu, linguagens corporais completamente diferentes. Já os gatos, como os músicos e os matemáticos, falam a mesma ?língua? no mundo todo.

Digo isso para dar um exemplo prático de como a comunicação é um tema complexo. Praticamente todos os seres vivos trocam informações entre si, mas talvez o que mais nos distinga dos outros animais seja o fato de termos elevado este nosso código instintivo ao mais alto nível de diversificação e sofisticação. Da densa linguagem humana, com sua carga infindável de memória e transmissão de conhecimento, nasceram as ferramentas e as artes e, em última instância, até mesmo o bem e o mal. Que, naturalmente, existem em estado latente num ambiente sem palavras, mas só alcançam seu verdadeiro potencial quando assim designados.

A palavra é, indiscutivelmente, a maior invenção humana. Apesar de todas as variantes da comunicação, será sempre, também, a mais difundida e praticada delas. Temos infinitas formas de trocarmos informações uns com os outros, das linguagens de assobios dos pastores das Ilhas Canárias ao código Morse, mas nada é tão universal ? tão humano -- quanto a palavra: todos os dias, em todos os cantos do planeta, em todas as circunstâncias possíveis e imagináveis, bilhões de pessoas conversam, ininterruptamente.

Esses diálogos se multiplicam em cartas, livros, jornais, filmes, mensagens eletrônicas, painéis luminosos, revistas, folhetos, peças, anúncios, outdoors, placas, documentários. Erga os olhos da página e tente contar quantas mensagens estão à sua espreita, embutidas em manuais de produtos, propagandas, marcas, noticiários...

Silvana Gontijo se impôs uma tarefa extraordinária: nada mais nada menos do que mergulhar neste estrepitoso universo de sons, imagens e palavras para nele encontrar as raízes da comunicação humana e, eventualmente, o seu significado. Das pinturas rupestres aos blogs, nada lhe escapou; a aventura intelectual pela qual ela nos conduz não podia ser mais fascinante e -- num mundo que se afoga no excesso de informação -- mais atual e necessária.

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