17.12.09

Livros para o Natal



Daqui a uma semana é Natal; é hora de correr para as livrarias e comprar os presentes que faltam. Posso ajudar? Fiz uma pequena lista com títulos que ficam bem em qualquer estante, e cabem em qualquer orçamento. Vejam o caso de “Retalhos”, de Craig Thompson; só em palavras, este seria um bom romance de formação, mas calha de ser, também, lindamente desenhado. É um livro, com certeza, no sentido de juntar várias páginas – muitas: para ser exata, 592 – entre duas capas, mas não é exatamente o que se espera quando se ganha um pacote com as suas dimensões. “Retalhos” é o que se chama em bom português de “graphic novel”, romance gráfico, rara história em quadrinhos que para de pé sozinha. Fala de crescimento, de amor e dos graves problemas da adolescência, e mesmo quem acha que não curte o gênero vai se surpreender com este lançamento da Quadrinhos na Cia. A tradução é de Érico Assis.

Querem algo mais convencional? Não seja por isso. “Clarice na cabeceira”, coletânea de contos de Clarice Lispector com um detalhe original: os contos foram selecionados por personalidades diversas e por outros escritores, que deram, cada qual, a sua razão específica da escolha. É ótimo livro, mesmo para quem já conhece os contos, exatamente por causa dos pequenos trechos de apresentação, tão reveladores sobre quem os escreveu. Também estou lá, mas ressalto que posso fazer propaganda à vontade, sem conflito de interesses, porque, assim como os demais, fui “paga” pela Rocco com a doação de uma coleção da obra completa de Clarice para uma biblioteca. A organização foi de Teresa Montero.

Querem uma autora nova? Tatiana Salem Levy. “A chave de casa” (Record), seu primeiro romance, publicado em 2007, ganhou prêmios importantes e merecidos no ano passado, e é um ótimo presente para quem gosta de boa literatura mas quer fugir dos clássicos. Um dia, a narradora ganha do avô a chave da casa em que ele viveu na Turquia, e parte em busca do que a família deixou para trás. Enquanto isso, o presente se transforma em passado.

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Para as pessoas que gostam de ensaios e de História, recomendo “Budapeste 1900”, de John Lukacs, retrato da cidade na virada do século passado, quando refulgia em todo o seu esplendor. Gosto tanto desse livro da José Olympio, aliás, que escrevi a sua apresentação.

Para quem tem criança na lista, “Mauricio, o leão de menino”, da Cosacnaify, uma delícia escrita pela Flavia Maria em 1969 e ilustrada pelo Millôr, livrãozão maravilhosamente contemporâneo em apresentação, linguagem e conteúdo.

Para quem é fã de aventuras malucas, “Os lugares do meio”, de Rory Stewart, que atravessou o Afeganistão a pé e sobreviveu para contar a história (Record).

Para quem não conhece muito bem o gosto literário do presenteado, um caminho seguro é “A sopa de Kafka”, de Mark Crick (Argumento), típico livrinho para presente, mas baseado numa ótima idéia: receitas contadas à moda de diversos escritores.

Para quem gosta de crônicas, “O ciclista da madrugada”, do Arnaldo Bloch (Record), sem nenhum favoritismo: leiam, e me digam depois se não é mesmo excelente.

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Na linha indiana que dominou o ano de todos na televisão e o meu ano particular pela viagem, alguns tesouros que já recomendei e torno a recomendar, sempre com o mesmo entusiasmo: “O tigre branco”, de Aravind Adiga, sem dúvida o melhor romance que li em 2009 (Nova Fronteira); “Hotel Yoga”, de Maura Moyniham, conjunto de seis contos cheios de vida e senso de humor (Seoman); “Índia”, de Jean-Claude Carrière, um dicionário amoroso digno dessa definição (Ediouro).

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Perguntei aos amigos do Twitter, do Facebook e do blog qual foi o melhor livro que leram em 2009. Queria descobrir se houve uma leitura comum, se algum título em especial marcou o ano, ao largo das indefectíveis listas de mais vendidos, mas ou 2009 foi um ano extremamente variado, ou os meus amigos são a mais heterodoxa das turmas.

Houve de tudo, de “O último chef chinês”, de Nicole Mones (sugestão da Roberta Sudbrack; livro encantador!), a “O menino do pijama listrado”, de John Boyne, mencionado por mais de uma pessoa e, de fato, poderoso e surpreendente; passando por clássicos como as lindíssimas reedições de Jorge Amado e de Lygia Fagundes Telles.

A lista é enorme e muito interessante; só lá no blog há mais de 70 comentários cheios de detalhes sobre os livros, mas vou publicar, logo mais, um apanhado do que foi recomendado.

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Minha irmã, que é ainda mais fã de literatura policial do que eu, escreveu o seguinte:

“Fico com “Todos os contos de Maigret”, de Simenon (L&PM, 392 páginas). Surpreendentes na economia de meios, na perspicácia da caracterização rápida de personagens, na capacidade de criar um ‘clima’ em poucos parágrafos, na agudeza das descrições dos locais, na beleza das construções das frases, na simplicidade das soluções para cada crime. Ao contrário do que costuma acontecer com histórias policiais, os contos me parecem mais completos e bem escritos do que os romances.”

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A foto ainda é da viagem. Aos domingos, quando a maioria das lojas de Chandni Chowk fecha, os alfarrabistas tomam as ruas. São quilômetros de livros usados, separados por temática entre os vendedores que, apesar de sujinhos e sentados no chão, conhecem muito bem o seu ofício.


(O Globo, Segundo Caderno, 17.12.2009)

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