12.2.06



Una furtiva lacrima

Uma coisa pequena (mas importante) que eu adoro nos filmes de Woody Allen é a abertura: sempre igual, com as letras com a mesma tipologia vazadas em branco sobre fundo preto, enquanto uma música dá o tom do que virá.

Em Match Point esta música é, pela primeira vez, uma ária de ópera: "Una furtiva lacrima", de "O Elixir do Amor", de Donizetti. Mas como Woody Allen é Woody Allen, a gravação é mono, antiga, aparentemente sem remasterização: Enrico Caruso. É ele também quem canta "Mi par d'udir ancora", do "Pescador de Pérolas", de Bizet -- uma das minhas árias favoritas -- e outros trechinhos variados, inclusive um, informa o imdb, de Carlos Gomes.

Mas o que está rodando na minha cabeça desde sexta-feira, sem parar, é "Una furtiva lacrima": dá vontade de cortar os pulsos.

Não é à toa que esta é uma das árias mais populares de todos os tempos.

O filme é fantástico, uma espécie de "Crime e castigo" remixado com Shakespeare, tenso do começo ao fim: uma parábola sobre a sorte, em que nem sempre as aparências correspondem à realidade. Atribuo boa parte deste clima à trilha sonora, composta basicamente de árias. A ópera tem um densidade dramática imbatível, que sublinha e acentua o destino das personagens.

A moral da história -- cuidado com o que você pede aos deuses: eles podem atender ao seu pedido -- não chega a ser surpreendente; mas o final é.

Há tempos Woody Allen não faz um filme tão bom.

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