9.5.05






A imagem da convergência

Houve um tempo em que os celulares Nokia eram os objetos mais desejáveis em qualquer vitrine de operadora. Outros fabricantes inventavam bossas e faziam gracinhas, mas a Nokia lançava tendências: além de imbatíveis tecnologicamente, seus aparelhos eram invariavelmente mais bonitos e elegantes do que os da concorrência. Mas a palavra "concorrência" não existe à toa; de modo que toda uma legião de fabricantes foi à luta. Ao mesmo tempo, a Nokia caiu numa temporada morna, em que praticamente não chegou a marcar pontos no quesito "Mamãe, eu queeeeeeeeero!!!" -- uma das molas propulsoras da indústria. Nos dois últimos anos fez vários lançamentos radicais, como o NGage ou o 3650, que tem teclado semelhante a um discador, mas parecia ter perdido a mão infalível dos velhos tempos.

Os primeiros sinais de que a calmaria estava por pouco foram vistos, no Brasil, durante a Telexpo, em março passado: quando há filas de gente num estande para ver aparelhos, ali há algo interessante. Em termos mundiais, o ano Nokia começou com uma surpreendente participação na PMA (Photo Marketing Association): ela foi não só a primeira fabricante de celulares a se apresentar na grande feira de fotografia, como, ainda por cima, o fez também na qualidade de maior fabricante de câmeras digitais do mundo, com cem milhões de telefones com câmera vendidos até o começo deste ano.

Graças à convergência, aliás, os números da Nokia são mesmo impressionantes: ela é também a maior fabricante de players de música (40 milhões de celulares com players vendidas) e de PDAs (25 milhões de smartphones abocanhados pelo mercado).

Na semana passada, com a realização de quatro mega-eventos simultâneos -- que foram ao ar em Amsterdã, Cancún, Hong-Kong e Kuala Lumpur -- ela fez a apresentação oficial da sua visão de futuro, e mostrou que os sinais de fumaça que vinha emitindo têm uma base concreta. Sob a sigla Nseries, que passa a designar o topo de linha, mostrou três pequenos objetos que vão disputar, com boas chances de êxito, não só o mercado de celulares como o de PDAs e o de players. Para isso fez algumas parcerias altamente estratégicas, não só sob o ponto de vista tecnológico, mas também de marketing -- que é, como a gente sabe, a alma do negócio.

A mais interessante é, com certeza, o contrato de exclusividade para celulares com a Carl Zeiss, que fornecerá os sistemas das pequenas câmeras embutidas. Elas produzem fotos de até 2 megapixels de qualidade impressionante. Pude brincar com um N90 (na foto) e fiquei admirada com a definição, a fidelidade das cores e a relativa ausência de distorção nas margens, bem comum até em câmeras digitais.

Com 31Mb internos, mais slot para cartões MMC, o N90 pode gravar até duas horas de video; tem um visor basculante excelente para ângulos difíceis e vem com uma suite da Adobe, especialmente desenvolvida para maquininhas móveis, que oferece várias opções práticas de tratamento de imagem no próprio aparelho.

Com disco rígido de 4Gb, o N91 tem a mesma capacidade de armazenagem do iPod mini (mas é muito mais flexível para downloads e troca de músicas), som estéreo, rádio FM, conexão com headphones sem fio e compatibilidade com acessórios Bose, Harman Kardon, JBL e Sennheiser (usa um plug padrão de 3,5mm). Em suma: é um player turbinado que também tira fotos, tem funções de PDA e dá telefonemas.

Já o forte do N70 é o peso pluma. Como os irmãos mais robustos, ele também faz fotos de 2 megapixels, roda e grava videos, e é um ótimo player e smartphone, mas com metade do tamanho dos outros.

A interessantíssima família apresentada a jornalistas, analistas de mercado e representantes de operadoras começa a chegar ao mercado no fim do ano. Embora a NSeries seja uma linha 3G, pronta para WCDMA e Edge, a idéia de mandar fotos de 2 megapixels ou baixar músicas inteiras pelo telefone não chega a ser muito prática; mas nem é essa a intenção da Nokia. Os três telefones podem se conectar a Macs, PCs e várias marcas de impressoras via USB ou Bluetooth; como os players, câmeras e PDAs que de fato são, podem fazer carreira solo, mas brilham mesmo quando aliados a computadores.

Dependendo do preço, ainda não definido, os aparelhinhos podem vir a fazer grandes estragos entre PDAs e players desconectados. Fotografia é outra conversa: ninguém que faz foto para valer vai trocar a câmera pelo N90; mas a verdade é que, se tiver um, vai, certamente, deixá-la em casa com mais freqüência.

(O Globo, Info etc., 9.5.2005)

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