25.3.04





Capivaras atingem o (merecido) estrelato

Depois de ganhar as páginas dos principais jornais e revistas do país, e de ser eleita a Musa do Verão-Que-Não-Houve, a capivara da Lagoa chegou, finalmente, às telas. Ou, mais precisamente, à tela : na sexta passada, “Capivara!”, o filme, foi apresentado à entusiástica platéia do Cobal Drive-in e aguarda, agora, convites para novas exibições.

Sou suspeita para falar. Não tenho nenhum envolvimento com a produção, até o dia da estréia nem conhecia os diretores, mas minha admiração confessa pela capivara pesa contra a imparcialidade de qualquer avaliação que eu possa fazer. Ainda assim, ouso afirmar que o curta -— de Felipe Sussekind e Felipe Nepomuceno — é um filminho engraçado, simpático, muito original.

Os dois Felipes, donos da pequena produtora ZR1, já fizeram juntos, há dois anos, “Brachtelles arachnoides”, um documentário sobre espécies raras da Mata Atlântica. E dedicam-se, no momento, a pesquisas para um terceiro filme, sobre os famosos jacarés urbanos da Zona Oeste.

Nepomuceno, de 29 anos, é o cineasta da dupla. Sua filmografia inclui, entre inúmeros outros, os documentários “Vila Mimoza”, sobre a tradicional zona de prostituição, a Zona propriamente dita, e “Mais um dia de calor no Rio”, montado a partir de recortes de jornais. Já Sussekind, de 30 anos, artista gráfico e fotógrafo, documenta a curiosa fauna urbana carioca e os diversos ecossistemas da região.

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Com sete minutos de duração, “Capivara!” não tem, naturalmente, a intenção de esgotar o assunto: como todos que as conhecem sabem, a vida das capivaras da Lagoa daria material para pelo menos duas horas no Discovery. A idéia básica do filme é apenas investigar a existência dos bichinhos, que durante um bom tempo passou por lenda urbana, e levantar histórias a seu respeito. Vários personagens interessantes dão depoimentos, de pescadores e vendedores de coco a um dos bombeiros (epa!) que participaram da primeira tentativa de captura das capivaras, devida, explica ele, ao “verdadeiro clamor de algumas pessoas”.

O ponto alto do filme é, lógico, a capivara em si. Os Felipes conseguiram filmar a fêmea num ótimo dia. Ela não quis gravar entrevista, mas nadou, rolou na lama e posou para a câmera, arrancando risos e aplausos do público da Cobal. O macho aparece apenas de relance, num recorte do GLOBO. Me gusta pelo discretito.

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Merece destaque especial a excelente trilha sonora de “Capivara!”, absolutamente perfeita para a protagonista, trilha descoberta por acaso por Felipe Sussekind. Durante uma visita a um amigo professor de piano, ele ouviu a gravação da composição de um aluno, baseada nos movimentos do kung fu. A música, ideal, deu ao autor, Jano Nascimento, a oportunidade de estrear como compositor e intérprete. Detalhe: Jano tem 12 anos de idade.

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A curiosidade por “Capivara!”, o filme, me levou a descobrir o Cobal Drive-in, de cuja existência eu sequer suspeitava. Promovido pela Cavídeo (leia-se Carlos Vinicius Borges, o Caví) e inspirado nos velhos cinemas drive-in, ele exibe seleções de curtas num telão de 8m x 5m montado no telhado entre o Galeto Mania e o Espírito do Chope, bem em frente ao estacionamento da Cobal do Humaitá. Em tese, é possível assistir aos filmes do carro, mas o fervo é mesmo nos restaurantes.

A festa é ótima e gratuita. Na primeira edição, que foi ao ar no último fim de semana de janeiro, os cineastas apresentaram curtas sobre futebol, música e o cotidiano carioca em geral; a segunda, realizada no último fim de semana, foi mais eclética, com 20 filmes nacionais e estrangeiros, do badalado “O jogo de Geri”, de Jan Pinkaya (Pixar), ao experimental “Ação da Interioridade”, de Roberto Berliner, de um minuto. Perto dele, “Capivara!” é uma superprodução.

Vocês não vão ver grandes anúncios do Cobal Drive-in, que é um evento alternativo e independente, mas fiquem atentos. Este cineminha esperto é a cara do Rio -— quer dizer, a maior diversão.

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E, já que falei nas capivaras: as duas estão gordas e bem, obrigada. Ambas foram vistas no último fim de semana. Ainda que não as encontre regularmente, tenho notícias freqüentes delas, dadas por amigos e leitores, que me mandam fotos e relatos de encontros felizes. Mas as duas continuam isoladas, coitadinhas, cada qual no seu canto, esperando que alguma alma caridosa as reúna ou lhes traga de presente outras capivaras que estejam sobrando por aí, em algum capivaral.

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É comovente ler os depoimentos dos pais de pitboys, louvando as qualidades dos filhos estudiosos e bonzinhos. Mas, sinceramente, prefiro ler, hoje, o lamento de pais cujos filhos foram em cana por cenas de violência explícita do que, amanhã, ter que ler os depoimentos de pais de vítimas, chorando os filhos mutilados ou mortos. Chega de achar que bandido é só quem vem do morro.


(O Globo, Segundo Caderno, 25.3.2004)

Um comentário:

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