29.11.07

Mamãe e Pipoca





Diários da motocicleta II


Sempre passei por alto por aquelas páginas de esporte em que pernas quebradas de jogadores de futebol são discutidas à exaustão, assim como sempre achei para lá de exageradas as imagens de atletas se contorcendo na grama e uivando de dor. Também nunca entendi o auê em torno do joelho do Ronaldo. “Caramba!”, pensava eu com os meus ossinhos inteiros. “Uma perna quebrada também não é nenhuma tragédia!”

No dia mesmo em que fui atropelada, ainda não tinha idéia da extensão do perrengue. Liguei para a redação para avisar que não faria a crônica daquela semana, posto que seria operada no dia seguinte, mas estava convencida de que, assim que os ossos fossem postos no devido lugar, minha vida voltaria ao normal. Começava ali um choque de realidade que, não tenho dúvidas, ainda me reserva muitas surpresas.

Uma perna quebrada não é, de fato, nenhuma tragédia. Dói pavorosamente mas, um dia, ficará boa e deixará de doer. Enquanto isso, porém, o portador da dita perna passa a viver numa espécie de limbo existencial, até porque não pode sair de casa. Não está doente, mas também não está vendendo saúde. Melhora dia-a-dia, mas a melhora é tão lenta que nem se nota. Com uma séria agravante: à medida em que a perna melhora, a cabeça piora.

Essa, pelo menos, tem sido a minha experiência. Sinto-me como uma tartaruga virada de costas, que não consegue pensar em outra coisa a não ser desvirar-se. Às vezes apoio o computador no casco e escrevo umas coisinhas, mas passo o grosso do tempo virada para cima, olhando o teto, o céu e o vaivém dos helicópteros. O ponto alto do dia é a visita da fisioterapeuta, que tenta me desvirar.

* * *

Apesar de tudo, relendo o blog, é impossível deixar de notar progressos importantes. Fico muito contente por ter tido força de vontade suficiente para escrever, especialmente nos dias ruins. Se eu não tivesse esses textos por testemunhas, não teria idéia do quanto já estive pior:

“Percorrer a ridícula distância da sala à cozinha virou uma aventura; ir ao meu quarto lá no fim do corredor é uma excursão que só vale à pena empreender no fim do dia, pra dormir; ir ao escritório, em obras, nem pensar”, escrevi no segundo dia em casa. “O próprio banheiro de visitas, que felizmente é banheiro mesmo, e não lavabo, mas que é ainda mais perto da sala do que a cozinha, virou ponto geográfico a ser cuidadosamente considerado antes que me anime a empreender uma incursão até lá. Tudo me parece horrivelmente distante, cada passo é um esforço sobre-humano, cada destino é uma viagem. Agora, que já não estou no hospital e começo a ‘pensar’ o corpo, descubro hematomas e pedaços doloridos onde antes tudo parecia OK. Meu braço esquerdo, por exemplo, que não tem um hematoma, dói demais. Minha perna direita, com duas manchas sinistras, está boa. Vá entender.”

No domingo passado, depois de um mês de casa, escrevi outro post amargurado – mas a diferença entre os dois é incrível:

“Hoje de manhã a enfermeira precisou sair para fazer uma prova. Ontem à noite disse que deixaria tudo arrumadinho pra mim, e que voltaria às duas da tarde. Achei ótimo. Já estou me achando bem independente, e a saída dela serviria para que eu testasse a minha capacidade de me virar sozinha. Acordei toda serelepe, abri a janela do quarto, dei bom-dia para os gatos, fui ao banheiro, me vesti e fui para a cozinha, me achando o máximo. Aí abri a geladeira para pegar o café da manhã -- uma fatia de abacaxi e uma vitamina de banana com farelo de aveia. Oops. Para tirar um prato ou um copo da geladeira a gente precisa de uma mão, certo? Só que para usar o andador a gente precisa de duas mãos. Resultado: tomei café em pé, dentro da geladeira, frustradíssima. Depois, já na sala, pronta a me espichar no sofá, me dei conta de que o travesseiro no qual apoio a perna estava no quarto, e que eu não tinha como trazê-lo de lá.”

* * *

Quem me chamou a atenção para o contraste entre os dois momentos foi o Paulinho, que deu um jeito de vir dos Estados Unidos para visitar a Pobre, Velha e Manquitolante Mãe Doente, mas que teve que voltar rapidinho para a família e o trabalho. De lá, acompanha pelo blog a minha vida de quelônio emborcado:

Acordei toda serelepe, abri a janela do quarto, dei bom-dia para os gatos, fui ao banheiro, me vesti e fui para a cozinha, me achando o máximo.

E é o máximo mesmo! Há apenas duas semanas, a única coisa que eu me lembro que você conseguia fazer era reclamar do maléolo... Comer em frente à geladeira é excelente, principalmente nos verões cariocas. Sem falar, claro, que ajuda com a recuperação, pois dá uma gelada no joelho também.”

* * *

Antes que alguém questione meu café da manhã, adianto: sim, é dieta. Pela primeira vez na vida estou me preocupando com o peso por razões não-estéticas. Quando o joelho bichado voltar à ativa, sofrerá menos se não tiver muito peso para carregar. Fazer dieta no estaleiro é punk, acreditem. O pior é que nem ao menos sei se o sacrifício está surtindo efeito, porque não consigo me pesar. A balança aqui de casa se recusa a dar informações precisas a sacis claudicantes.


(O Globo, Segundo Caderno, 29.11.2007)

28.11.07

Este é pra Monca: parabéns!

Ponto de vista




Eu não preciso... ;-)



O Tom me falou de um guarda-chuva revolucionário, que avisa ao usuário se vai chover. Pois eu, que em geral quero tudo o que aparece no Think Geek, dessa vez estou dando de ombros.

Quem precisa de guarda-chuva esperto quando tem joelho bichado?!

Os parafusos e placas implantados na minha pata doente avisam, com um dia de antecedência, quando vai chover.

Antigamente, eu achava que essa história de ossos metereologistas era lenda urbana; pois não é não.

Bom, alguma coisa de positivo eu tinha que tirar disso tudo, né?

26.11.07

Noturno




Amigos :-)




Ainda falta muito

Hoje de manhã (para mim ainda é domingo) a enfermeira precisou sair para fazer prova num curso de CTI. Ontem à noite disse que deixaria tudo arrumadinho pra mim, e que voltaria às duas da tarde.

Achei ótimo.

Já estou me achando bem independente, e a saída dela serviria para que eu testasse a minha capacidade de me virar sozinha.

Acordei toda serelepe, abri a janela do quarto, dei bom-dia para os gatos, fui ao banheiro, me vesti e fui para a cozinha, me achando o máximo. Aí abri a geladeira para pegar o café da manhã, uma fatia de abacaxi e uma vitamina de banana com farelo de aveia.

Oops.

Para tirar um prato ou um copo da geladeira a gente precisa de uma mão, certo? Só que para usar o andador a gente precisa de duas mãos.

Resultado: tomei café em pé, dentro da geladeira, frustradíssima.

Depois, já na sala, pronta a me espichar no sofá, me dei conta de que o travesseiro no qual apoio a perna estava no quarto, e eu não tinha como trazê-lo de lá.

Enfim -- para efeitos práticos, continuo uma tartaruga virada de costas.

Ai ai...

23.11.07

Pessoas...

Muito obrigada pela força e pelos links que vocês vêm postando nos comentários!

Não estou comentando, nem respondendo direito aos emails, porque o pé está inchado e tenho passado mais tempo deitada do que sentada. Ainda que a maquininha nova seja muito prática e levinha, digitar na horizontal é impossível.

Saibam, porém, que tenho lido tudo o que me escrevem; presto a maior atenção às sugestões, e fico muito comovida com o carinho.

Ser objeto de tanta gentileza e de tantas energias positivas é tudo de bom para a recuperação de bípedes estropiados...

Vocês são o máximo! :-D

Só faz bobagem...




Boa noite




21.11.07



Diários da motocicleta


“Estou com o N95 e com o K790 na bolsa“, pensei. “Não posso desmaiar.” Eram cinco e meia da tarde, eu acabava de ser atropelada por uma moto e de descrever um ligeiro arco no espaço antes de aterrissar no asfalto em frente à Candelária. Algo tão estranho acontecera com a minha perna esquerda que até os fios de cabelo doíam. Quando o motoboy e um transeunte me carregaram do asfalto para a calçada, achei que nem os celulares favoritos conseguiriam manter meu sistema operacional funcionando. A dor estava forçando um apagão que o cérebro não descartava de todo, pelo contrário. Mas viver numa cidade sem lei tem desses problemas: a gente não só é atropelada num sinal vermelho como, ainda por cima, tem que fazer o possível e o impossível para não perder a consciência se quiser conservar a bolsa e a vida.

Na calçada, escorada numa barra de ferro enquanto esperava socorro, passei por sensações esquisitas: náusea, tonteira, um mundo que insistia em escurecer. Comecei a prestar atenção em coisinhas miúdas para me manter na superfície. Os jeans estavam com rasgões enormes e eu pensava quais poderiam ser cerzidos e quais poderiam ficar como estavam, para um look radical e personalizado.

-- Não acredito nisso! -- exclamou a Olívia semanas depois. -- Quer dizer que se você tivesse batido a cabeça e viesse a morrer no hospital seus últimos pensamentos teriam sido a respeito de dois celulares e de um jeans da Gap?!

Sinto dizer que sim. Nada de sublime me cruzou a mente; não vi nenhum playback da minha vida; não vi túneis iluminados, nem recebi grandes revelações do Todo-Poderoso.

* * *

O socorro chegou na forma de um carro pequeno, dirigido por um amigo da moça que estava de carona com o motoboy. Fui arrastada para o banco de trás por pessoas bem-intencionadas que não leram nenhum manual de primeiros socorros. O pior é que o meu cérebro estava funcionando tão mal que eu mesma não me lembrei das recomendações básicas de não se mexer em feridos.

-- Qual é o seu plano de saúde? -- perguntou a moça. Respondi, e ela mandou o motorista ir para o Copa d'Or. Pelo sim pelo não, liguei para o jornal para me certificar de que era isso mesmo. Era.

-- Hmmm, -- pensei com os meus jeans rasgados. -- Quer dizer que eles têm prática de atropelar pessoas.

A moça ligou para um amigo:

-- Não me espera não, que o Edson atropelou uma senhora sem querer e eu estou levando ela para o hospital.

-- Hmmm, -- pensei novamente. -- Quer dizer que eles atropelam pessoas de propósito nas horas vagas.

* * *

Na terça de manhã, depois de uma série aparentemente interminável de exames, fui operada. A cirurgia, que durou quatro horas, me deixou dois cortes de mais de um palmo cada de um lado e de outro do joelho, e uma quantidade de placas e parafusos segurando ossos cujos nomes eu desconhecia. Sou do tempo em que patela se chamava rótula e fíbula atendia por perônio, e mesmo assim nunca soube direito qual era qual. Aprendi, além disso, que osso sangra muito e dói mais ainda.

No dia seguinte, o cirurgião veio me ver. Estava contente e bem humorado, o que era bom sinal, e me cumprimentou:

-- Parabéns! Você sabe como quebrar um joelho!

Até hoje não tenho certeza se isso foi um elogio.

* * *

Muita gente quis que eu fizesse boletim de ocorrência do atropelamento. A culpa, no entanto, não foi do rapaz que me atropelou. Enquanto motos forem consideradas veículos inofensivos pelo Detran, enquanto costurar for prática rotineira e aceita por todos, enquanto empresas prometerem a seus clientes que podem entregar qualquer coisa em qualquer lugar da cidade em dez minutos, não haverá boletim de ocorrência que adiante nada. Os motoboys são pobres diabos que se acidentam continuamente e morrem como moscas em troco de uma miséria. São uma ferida social que não se cura com queixa na polícia.

* * *

Hoje faz um mês que tive a infeliz idéia de atravessar a rua para aproveitar a luz e tirar umas fotos da Candelária. Estou em casa há três semanas, quase sempre com a perna para o alto. Atualmente, a dor me incomoda menos do que os efeitos psicológicos da imobilidade: estou entediada, impaciente e ridiculamente desconcentrada. Sofro com a fisioterapia, e a perspectiva de encarar exercícios sérios assim que puder pisar no chão me deixa muito contrariada. Ainda outro dia cobrei da Mamãe:

-- Como é que pode isso?! Por que é que eu tive que herdar a disposição atlética do Papai e a paciência do Nonno?!

Meu Pai, cujo único esporte era xadrez, era, por outro lado, a pessoa mais paciente do mundo. Já o Nonno, meu avô materno, atleta por excelência a vida inteira, e dono de uma força de vontade inquebrantável, era, digamos, um tanto explosivo.

-- Tá, tá, -- emendei na hora. -- Eu reconheço, o Nonno era bem mais impaciente do que eu.

Mamãe nem se deu ao trabalho de levantar os olhos do jornal:

-- Só porque era homem. Se as mulheres fossem impacientes como os homens, a humanidade já tinha se extinguido há milhões de anos. De resto...


(O Globo, Segundo Caderno, 22.11.2007)

Duas




Há!

Ontem, como vocês perceberam, não foi um dia bom. Acho que o feriado contribuiu para isso: a Lagoa estava cheia de gente de joelho bom, zanzando para cá e para lá, andando de bicicleta e pedalinho, correndo, andando, pulando.

Parecia provocação, e eu e o meu joelho bichado nos sentimos inúteis e humilhados.

Felizmente, tenho um DNA bem estruturado, devidamente reforçado por uma educação (quase: por conta do meu Pai) prussiana.

-- Como é que é, vai ficar se queixando?! -- gritaram umas sinapses revoltadas, caprichando no joelhaço. -- Já pro teclado.

De modo que escrevi a coluna, e volto ao ar amanhã.

Pois.

E, mais uma vez, agradeço muito a todos vocês, que estão me ajudando enormemente a superar os meus moods malsãos e essa fase chata chata chata.

Vou até googlar reiki para ver do que se trata.

Muitos beijos, amigos queridos!

19.11.07

Prisioneira

É preciso uma perna quebrada para que a gente se dê conta da dificuldade de usar certas expressões. Eu ia chamar este post de "A quantas ando" -- mas, oops, não ando. "Como vou" também não serve -- não vou. "Em que pé estou" é um pouco melhor, e tem resposta -- no direito, porque o esquerdo ainda não está.

Mas, enfim, como estou?

Continuo com os movimentos muito restritos: ainda passo a maior parte do tempo deitada, não posso pisar na perna esquerda, o joelho ainda está bastante inchado.

Por causa dessa imobilidade, o resto do corpo está começando a dar sinais de desagrado. As costas doem, o ombro reclama, enfim -- não é difícil imaginar, né?

Mas o que mais me incomoda, atualmente, não é físico; é o meu estado de espírito. Estou entediada, impaciente e ridiculamente desconcentrada.

Continuo quase incapaz de ler, não consigo escrever, filmes não me interessam.

Minha atividade intelectual se restringe a afinar a maquininha nova, instalar programas, estudar as suas possibilidades.

Mal chego à mailbox.

Meu amigo Roberto, que conhece os caminhos tortos da massa cinzenta, diz que isso é absolutamente normal: como qualquer prisioneira, só consigo pensar no fim da pena.

Em suma: estou condenada a ter paciência, que não é o meu forte.

Paciência...




Separei a historinha da Capi e do Tedibär num blog chamado
Diários da Capivara.

Amanhã! Bazar da Alfa! Imperdível!



A Alfa, que fez os meus lindos vestidinhos, apresenta amanhã, num bazar, a nova coleção das suas grifes Boto Rosa e Estado Alfa.

Recomendo MUITO: a moça é super talentosa, e suas roupas são bonitas, bem feitas e gostosas de vestir.

O bazar rola amanhã, terça, dia 20, entre 11h e 20h, na Rua Tonelero 200 BL B 301, Copacabana.

Qualquer dúvida, os telefones são 3511-2420 e 8238-7779.

Aproveitem!

Rotina




16.11.07

A menina da bolha

O tempo passa devagar por essas bandas.

Estou melhor, naturalmente, e sinto que tenho mais mobilidade, mas isso por enquanto significa apenas que não preciso de ajuda para me deitar ou me sentar -- ainda assim, acreditem, faz uma grande diferença!

Mais do que a dor e as fisgadas por causa do frio, me incomoda a incapacidade de concentração: ler é uma dificuldade, DVDs só consigo assistir, quando assisto, em suaves prestações, sequer ouço música.

Escrever de verdade é uma tarefa impossível.

Converso com amigos, me divirto com os gatos, observo as nuvens e os pássaros na janela.

A maquininha nova está sendo um bálsamo, porque há um longo caminho a percorrer até que fique do meu jeito. É uma belezinha -- un gioiello, como bem definiu meu amigo Roberto, recém arrivato de Roma.

Consigo erguê-la com uma mão só, segurá-la no colo ou apoiá-la num travesseiro, no peito, quando estou deitada (imaginem uma tartaruga virada de costas, com um notebook apoiado no casco: sou eu).

A tela é, disparado, a mais espetacular que já vi, tanto em cores quanto em definição.

O teclado é pequeno mas muito confortável.

Seu único defeito é rodar o insuportável e cumbersome Vista. Infelizmente a Sony não fabrica a linha TZ com XP, sistema muito mais sólido, rápido e eficiente.

(Putz! Nunca pensei que ia ficar com saudades do XP. O que é a vida...)

No momento, aguardo ansiosamente que sejam resolvidos alguns problemas de drivers para correr para o "downgrade", que vai ser uma melhoria considerável.

O grande consolo dos usuários Vista é que, dizem, o Leopard, da Apple, está ainda pior.

Belo consolo, uh?

Mamãe, enquanto isso, foi para Porto Alegre disputar uma etapa do campeonato brasileiro. Diz que está um frio de rachar. E que está, claro, ganhando todas as provas em que se inscreveu.

Eu posso com uma Mãe dessas?! :-)

Irineu em três tempos







Fotos clicadas com uma Canon S5

Lá em frente




Irineu a sono solto




Lá em frente




Lá em frente




15.11.07

Grrrrrrrrrrr

O Flickr está maluco!

Mandei várias fotinhas pra cá ao longo do dia, e nada -- provavelmente vão aparecer mes que vem.

No mais, desculpem o sumiço: estou por conta do joelho velho e da maquininha nova... :-D